Exemplo Replicável?

Li hoje, no Notícias Magazine, um artigo muito interessante assinado por Sara Dias Oliveira com o título “A Faculdade que Transformou uma Aldeia em Cidade”.
Despertado pelo título, comecei por ler a curta introdução que transcrevo integralmente:

“Uma cooperativa de ensino superior com cursos de saúde instala-se em Gandra, Paredes,nos anos 90. Tudo muda. A economia cresce, a aldeia passa a vila, a vila a cidade. O instituto universitário tem agora a maior percentagem de alunos estrangeiros do país e poderá ser a primeira instituição privada a receber um curso de Medicina. O comércio agradece”.

Defensor assumido, como sou, do Ensino Público, apressei-me a ler todo o artigo para tentar encontrar a defesa da minha tese de que um bom ensino privado pode ser um excelente complemento à via pública. E encontrei.
Em 1990 a CESPU (Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário) instalou o seu primeiro polo em Gandra, em terrenos disponibilizados por um dos fundadores. Na estrada EN15 que ligava o Porto a Vila Real. Havia por lá, segundo o relato, um restaurante e um prédio com uma loja de móveis. Gandra era uma aldeia com cerca de cinco mil habitantes. Hoje é uma cidade multicultural cuja unidade de ensino universitário tem a maior percentagem de alunos estrangeiros do país. São 405 estrangeiros num total de 1238 estudantes, principalmente franceses, espanhóis e italianos. Há cafés, restaurantes, supermercados em urbanizações que nasceram para satisfazer as necessidades de uma nova população.
A CESPU tem 4 edifícios em Gandra. Nos laboratórios de investigação do seu curso de Medicina Dentária trabalham 98 doutorados, 40 alunos de doutoramento e 94 de mestrado. Nos últimos 3 anos este departamento publicou 408 artigos em revistas internacionais. Já se candidataram para abertura de um curso de medicina que, se se concretizar, será a primeira instituição privada a ter um curso nessa área. Segundo o Presidente do Conselho de Administração, doutorado em medicina, a CESPU não abandonará o seu princípio de especialização na área da saúde.
Os estudantes estrangeiros têm, nos seus primeiros anos, ensino obrigatório de português, em função das necessidades específicas de cada um.
A antiga estada EN15 é hoje uma larga avenida com edifícios modernos e atividades comerciais adaptadas às exigências desta nova população, como bancos, cabeleireiros, residências universitárias, salões de estética e cerca de 15 restaurantes. Claro que o nível cultural da cidade também aumentou, como é fácil de concluir. Tudo mudou. Há estudantes portugueses, franceses, italianos e até uma peruana, de Lima. Neste momento a procura dos alunos estrangeiros é três vezes superior ao número de vagas.
Tendo começado em 1982 em São Roque da Lameira, Porto, a CESPU detém 80% do Hospital Particular de Paredes, 25% do Hospital Particular de Barcelos e 100% dos Anjos da Noite, rede de cuidados domiciliários em Lisboa. Tem parcerias com o Instituto Superior Politécnico de Benguela, em Angola, com a Universidade de Barcelona, com a Universidade Privada de Marraquexe e colabora na restruturação de cursos em Dakar, no Senegal.

Aqui fica um exemplo extraordinário de âmbito educacional e cultural que, ao longo dos anos, foi responsável pelo virtuoso desenvolvimento de uma região e, no fundo, do país. São visões abrangentes desta natureza que enriquecem a oferta no ensino e complementam as virtudes do ensino público. Outros casos existem no país neste âmbito, mas talvez este seja o mais significativo para a política do ensino e desenvolvimento regional. Seguramente replicável noutras zonas do país, desde que desenvolvidos com seriedade e profissionalismo. Conheço situações que bem mereciam estudos e programas de desenvolvimento, devidamente programados e financeiramente suportados, para desenvolvimento de muitas localidades. Mas falta o que é mais difícil: a visão empresarial e a capacidade de risco suportado que só são possíveis com níveis culturais cada vez mais elevados.
Mas este caso indica um caminho que, estou certo, poderá ser replicado. Para bem do país.

Um pensamento sobre “Exemplo Replicável?

  1. Muito interessante, este assunto ! Um assunto, como outros, se tem mantido no anonimato e longe dos escaparates jornalísticos do país. A evolução quase ignorada, pouco acompanhada pela comunicação social, sempre mais preocupada com o espectáculo, ( sempre o espectáculo ) mesmo que ele se transforme no dramatismo lamentável dos últimos dias, agora mais virados para os aproveitamentos políticos, já esperados para as próximas autárquicas. A sua visão do mundo, amigo Manuel José, bastante iluminada, deu vida com a sua força de expressão, e frequentemente vem enriquecer um Blog simpático, que para pena minha, tenha mais ouvidos do que vozes ( passe a minha expressão maldosa.)..! E é bom que se mostre, e se discuta o bom que se faz por cá a todos os níveis, e nos vai criando alento para reerguer uma moral já tão desgastada, com os epítetos de lixo, que vilemente nos quiseram galardoar…! ( Há sempre quem conte cavalos magros, no quintal do vizinho ). É bom que se discuta, porque a Democracia é isto mesmo, um ” melting pot ” de opiniões, que se afina com a discussão…!

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