CARTAS DO FUTURO – 1983

 

Às vezes  faz-nos bem relembrar o que gente interessante disse há uns anos atrás para, que mais não seja,  confirmar ou não os seus raciocínios da época em que os elaboraram.

Recorri, por essa razão, a escritos de Alvin Toffler que, na época em que com ele me identifiquei, muito me impressionaram.  Toffler foi um escritor  norte-americano doutorado em letras e ciências,  sempre interessado na revolução digital, na revolução das comunicações e no desenvolvimento tecnológico. Nasceu em Nova Iorque em 1928 e morreu em Los Angeles em 2016.

Em 1970 escreveu o seu primeiro livro de êxito mundial, “O Choque do Futuro”, que vendeu mais de 7 milhões de exemplares sem abordar temas populares ou mundanos. O livro era uma obra séria de análise e de crítica à sociedade que marcou, profundamente, todos os que à data o leram, independentemente de qualquer categoria social ou preferência política. Em 1980 lançou o seu segundo êxito monumental, “A Terceira Vaga”, que foi divulgado e traduzido em dezenas de línguas por todo o mundo.  Em 1983 surgem  “As Cartas do Futuro” que são, ao fim e ao cabo, um conjunto de entrevistas que lhe foram feitas sobre os mais variados temas que já tinham sido por si abordados nas obras referidas.

Deste livro “As Cartas do Futuro” selecionei apenas uma pergunta que lhe foi feita (das largas dezenas que ali estão contidas) e, claro, a respetiva resposta. Talvez interesse para temas que se  debatem  na nossa atualidade:

 

Pergunta: Acha que os movimentos mais separatistas, como no Canadá ou na Europa, são, antes de tudo, culturais?

Resposta: Naturalmente, é preciso nunca subestimar a componente cultural – como as querelas linguísticas na Bélgica ou no Canadá, ou as particularidades étnicas e históricas em França e em Espanha.  Mas quanto mais essas regiões se tornarem economicamente, ou potencialmente, viáveis,  mais autonomia reclamam.  A Escócia tem o petróleo do mar do Norte. O Quebec estima, com mais ou menos razão, ser capaz de fornecer energia hidroelétrica  à Nova Inglaterra. O ponto fundamental é que essas entidades, quer se lhes chame regiões, nações ou outra coisa qualquer, divergem em vez de convergirem. E isso tem por consequência que a gestão centralizada das suas economias a nível nacional ficará cada vez mais afetada.  Os velhos instrumentos de política económica nacional, tais como a fiscalidade nacional ou o controle da massa monetária pelos bancos centrais, são instrumentos rudimentares e não seletivos, tendo em vista uma economia orientada para a fabricação de bens. E essas economias multinacionais e regionais (ou mesmo setoriais) adquirem mais importância que as nacionais. 

Tudo isso põe um sério problema tanto ao banqueiro centralizador capitalista, como ao nacionalizador socialista.  Chamei a esse fenómeno de “problema de adrenalina” e, para ilustrar, utilizo a parábola do hospital: a nossa economia sofre de doenças variadas mas os nossos economistas e os nossos governantes, quer sejam monetaristas, partidários do estado providência ou socialista, são como os médicos ao fazerem o giro de visitas hospitalares e prescrevem o mesmo tratamento a todos os pacientes – uma injeção de adrenalina – quer se trate de uma fratura de perna ou de um tumor cerebral.

As políticas nacionais uniformes hoje em vigor têm consequências cada vez mais nefastas para as economias regionais ou locais. Arriscam-se igualmente a criar turbulências imprevistas que serão sempre um encargo para a economia mundial. 

 

Bom, esta entrevista foi dada em 1983 e competirá aos estudiosos lê-la de novo e refletirem sobre o que ali está dito.  Talvez se aplique a coisas que se estão a passar por aí…

 

Um pensamento sobre “CARTAS DO FUTURO – 1983

  1. Um assunto demasiado sensível que nos faz pensar, como em jovens, seríamos capazes de optar por uma ideia revolucionária de independência, num entusiasmo romântico da vida, e de a contrariar, por vezes, quando alcançamos a idade sénior…! Inexplicávelmente, será este último, o resultado confortável do meu raciocínio ..!

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