A lição do camaleão

Nas minhas andanças militares pela África profunda nos anos de guerra em que Portugal esteve ali envolvido, tive oportunidade de contactar com culturas africanas bem enraizadas, que desconhecia por completo, e em que, algumas, muito me surpreenderam e impressionaram.

Nessa África profunda, bem longe dos meios urbanos, as populações vivem ao ritmo das estações. O movimento do Sol regula, assim, as diversas atividades, e também as suas vidas; em consequência, esses povos vivem, e pensam, à luz das suas tradições, com a enorme sabedoria transmitida oralmente pelos seus ancestrais.

Em Madina do Boé, na parte SE da Guiné-Bissau, convivi durante longos meses com uma população pertencente a uma das etnias fulas. Na convivência diária com os seus usos e costumes, constatei com surpresa que existia ali uma ligação espiritual e religiosa a um grupo existente em Bandiagara, na margem sul do rio Niger, no Mali, portanto bem longe da Guiné-Bissau.

Foi então que ouvi pela primeira vez falar do “Hamalismo”, uma corrente minoritária do Islão. Para conhecer um pouco desse Movimento obtive em livrarias francesas alguns livros, por sorte, de conhecidos sábios africanos, um deles com uns magníficos “Contos da Savana”. O seu autor, AMADOU HAMPÂTÉ BÃ (1900-1991), nasceu no Mali, desempenhou várias funções nos Países de expressão francesa na África Central, e foi durante vários anos elemento importante e muito ativo da UNESCO em Paris.

É dele o que se segue, “A lição do Camaleão“, que numa tradução livre achei oportuno partilhar no “tempo que passa”.

« Sigam a lição do camaleão! Ele é um grande professor. Se o observardes com atenção vereis…

Primeiro, quando se decide a avançar numa direção, nunca olha para trás. Portanto, quando estabelecerdes um objetivo para a vossa vida, não deixeis que nada vos deixe afastar dele.

Depois, quando se movimenta, nunca vira a cabeça mas os seus olhos estão sempre olhando para cima e para baixo. O que quer dizer: Informai-vos! Não acrediteis que sois únicos sobre a Terra; há sempre uma situação e um ambiente à vossa volta.

Quando chega a qualquer lugar, o camaleão toma a cor do que o rodeia. Isso não é hipocrisia, é antes tolerância, e também o “saber viver”.

E que mais faz ainda o camaleão? Quando decide andar, primeiro balança uma das suas patas anteriores para ter a certeza de que as suas patas posteriores estão firmes e não o deixam cair. Só depois se movimenta em segurança. É o que se chama a prudência no caminhar!»

Neste início de Ano Novo, aqui deixo a todos os frequentadores deste blogue os meus votos um ótimo Ano Novo!

José Aparício, LIS, 03Jan2018

2 pensamentos sobre “A lição do camaleão

  1. Já tive vários camaleões na mão…! Apreciei a sua forma de actuar, o seu andar balanceado e aquele seu olhar curioso. Não tive o cuidado, de me aperceber da sua sabedoria…! Isto, de camaleões, tem muito que se lhe diga…!

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  2. Excelente texto. Parece o sumo de difíceis experiências vividas. Ninguém mais poderá esquecer a lição do camaleão. Cada passo que dermos, vamo-nos lembrar. Claro que há os que só pensam na mudança de cor, mas esses a gente conhece-os ou adivinhamo-los.

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