FALEMOS DA FINLÂNDIA

Desde há anos que muitos dos nossos políticos mencionam a Finlândia como um país de exemplos, com regras institucionais que parecem desafiar as nossas metas como as de muitos outros países no mundo. Fazer como na Finlândia, adotar os métodos finlandeses, ter o mesmo progresso da Finlândia. Em campanhas eleitorais é apelativo e desperta  a curiosidade nativa. Depois passa a falar-se menos dos finlandeses para, mais tarde, aparecerem, de novo, as estatísticas a indicarem que ainda não chegámos lá. Mas o que é isto, afinal, do sucesso finlandês? Será ele transportável para outros países? Talvez valha a pena, sem grandes aprofundamentos, apercebermo-nos um pouco da realidade daquele país.

A população da Finlândia é de cerca de 5,5 milhões de pessoas (metade da população portuguesa); 31% do PIB é gasto em políticas sociais e de bem-estar; a Finlândia é o terceiro país do mundo a respeitar a igualdade de género e há 150 anos 10% da população morria de fome. O sistema judicial finlandês é o mais independente do mundo; a sua polícia é a mais fiável; os seus bancos são seguros; as suas empresas são as segundas menos corruptas do mundo; as suas eleições e os seus cidadãos são dos mais livres do mundo. Como aconteceu isto? Como diz o prémio Nobel da paz, economista nascido em Helsínquia, Bengt Holmstrom, “não há dois países iguais”. Os métodos finlandeses podem não resultar em países com antecedentes e realidades diferentes. Podemos começar pela geografia e, a sua consequência, o clima. Tarja Halonen, presidente do país de 2000 a 2012, diz que “vivemos num lugar frio, duro e remoto. As pessoas têm que trabalhar muito para si próprias. E têm que ajudar os seus vizinhos”. Bruce Oreck, que foi embaixador dos Estados Unidos durante o mandato de Obama, decidiu ficar no país e diz que aqueles factores tiveram muita influência a longo prazo. “Os finlandeses têm auto-confiança, são discretos mas também muito dependentes de uma sociedade altamente cooperativa, onde as regras contam”.

A Finlândia foi governada pela Suécia quase 600 anos e cerca de um século pela Rússia. Embora “em geral e democraticamente pobre” nunca houve servos nem aristocratas. Foi sempre uma sociedade sem hierarquias.”  Mesmo antes da sua independência em 1917 os estratos sociais sempre foram muito menores que em outros países. O fenómeno histórico e empresarial da Nokia ao instalar-se, há anos, numa aldeia isolada mas com gente educada, foi o arranque da modernização tecnológica do país. A Nokia já foi vendida mas deixou um lastro de progresso na sua esteira. As empresas pagam “religiosamente” os seus impostos. A maior empresa finlandesa atual, Supercell, criadora de jogos de estúdio, paga mais de 800 milhões de Euros de impostos anuais. Isto contribui para a clareza de procedimentos da sociedade. O sistema de ensino livre foi estabelecido em 1866, antes da independência, tendo sempre por base o princípio de que “a Educação era a chave para o desenvolvimento”. Desde a independência,  cerca de 30% dos chefes de estado e de governo finlandeses foram professores universitários que “formataram o país criando confiança na mobilidade social”.  Não foi por acaso que, de acordo com um decreto do século XIX, não havia casamentos na igreja luterana sem que os noivos passassem  numa prova de leitura.  “Sempre era um incentivo para aprender a ler”, comenta Halonen. Atualmente as empresas resultantes de fusões ou ligações amigáveis atingiram um recorde de investimento na área da investigação e desenvolvimento em 1990, próximo dos 4% do PIB.  A corrupção e o crime organizado não existem. E isto reflete-se, claro,  no ambiente empresarial. Os condimentos mágicos da Finlândia parecem  simples: auto-confiança, cooperação, igualdade, respeito pela educação, segurança.

Todos estes princípios poderão ser replicados noutros países porque são, aparentemente simples e fáceis. Mas não duvidemos que os diferentes antecedentes históricos e geográficos contribuem muito para o desenvolvimento daquele modelo. Concentremo-nos na Educação porque, apesar de tudo, a partir daí, muita coisa boa pode ser construída. Aceitemos que os nossos dirigentes evoquem o modelo finlandês mas obriguemo-los a cumprirem essa orientação. Com a nossa ajuda, porque nós somos a parte essencial desse sistema. Com o nosso exemplo, de uma forma decente.

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