OS NÃO-BINÁRIOS

Quem teve a oportunidade de ver o último Festival da Eurovisão da Canção Europeia terá ficado indeciso ou indiferente à maioria das canções que por lá passaram, tal a sua semelhança rítmica, os prodigiosos efeitos de luzes e os bailados envolventes. As melodias cantadas são, na maior parte dos casos, completamente ofuscadas pela barulheira circundante. O que vale é que não temos que decidir nada. Há uns júris nacionais, em princípio constituídos por peritos, que se encarregam dessa espinhosa missão de escolher a canção vencedora.

Eu, que não sou perito, devo dizer-vos que a melodia que mais me reteve o ouvido foi a da canção israelita que, evidentemente, levando em conta o caos da guerra em que Israel anda envolvido, diria até, criminosamente envolvido, dificilmente poderia ganhar. Porque, também não é novidade para ninguém, que os interesses de bastidores (políticos, económico-regionais, financeiros e de fortes grupos de interesses sociais) são muito poderosos e o vencedor é para nós, grande parte das vezes, inesperado.

Não sei se algum desses fatores foi determinante na busca da canção vencedora mas o suíço Nemo ganhou com o aplauso generalizado do festival e, diga-se de passagem, com uma canção que teve o mérito de ficar nos ouvidos (mesmo dos mais duros).

O cantor deu, no entanto, origem a um debate muito aceso. Ele não se inclue na generalidade dos géneros mais vulgarizados (masculino e feminino) mas bate-se socialmente pelo reconhecimento de um terceiro género. Coisa, no entanto, também discutível porque, tanto quanto se pode ouvir e ler dos entendidos, existem mais géneros para consideração. Mas, enfim, cinjamo-nos a esta disputa pelo terceiro género, coisa que o país do vencedor Nemo, a Suíça, oficialmente não reconhece. O artista, falando aos jornalistas disse claramente: “Na Suíça não se reconhece o terceiro género e eu penso que isso é completamente inaceitável. Precisamos de mudar”.

Interrogado sobre o que se poderia fazer afirmou que iria confrontar o ministro da Justiça, Jans, para legalizar a situação. O ministro tentou falar telefonicamente com o artista, o que até esta data ainda não tinha acontecido, para ser marcada uma reunião, não deixando de lhe dar os parabéns pela vitória na competição. Há cerca de 18 meses o governo suíço rejeitou uma proposta para a legalização oficial de um terceiro género, argumentando que o modelo binário de géneros continua “muito ancorado” na sociedade suiça. O problema não está previsto para debate mas a vitória de Nemo com a sua canção “The Code” (O Código) talvez seja um forte pretexto para essa nova discussão. Aliás, uma representante do partido político “Verdes”, Sibel Arslan, já lançou nas redes sociais o #Break The Code, facto que vai levantar acesa controvérsia com o governo, levando em conta que ala jovem do partido Verde Liberal já disse que o assunto tinha que ser “resolvido já”.

Há já diversos países que reconhecem a identificação de não-binário em documentos oficiais. É o caso da Alemanha que, desde 2018, autoriza o registo de pessoas como “diversas”; e da Austrália que permite que as pessoas escolham entre, masculino, feminino e indeterminado nos passaportes.

E por cá, como é que a coisa anda?

Um pensamento sobre “OS NÃO-BINÁRIOS

  1. Este assunto, de grande actualidade, é muito complexo. Correndo o risco de ouvir todas as críticas atrevo-me a deixar uma opinião . Para considerar todas as possibilidades os géneros deveriam passar a ser 5 : masculino, feminino, os masculinos que se consideram femininos, os femininos que se consideram masculinos e os neutros ( ara pessoas que não se consideram nem masculinos nem femininos)

    Liked by 1 person

Deixe um comentário