Políticos e Empresários

Na sua crónica de 14 de Março, Érik Zemmour (Le Figaro) chama, com grande oportunidade, a nossa atenção para dois livros essenciais de Pierre Musso:  “A Religião Industrial” (escrito há cerca de dois anos) e o mais recente  “O Tempo do Estado-Empresa”. Em ambos os casos somos convidados a refletir sobre a pertubadora mistura do Estado com o Poder Empresarial, fruto, diz-se, da famosa globalização,  mas que tem prevertido as sempre difíceis relações entre governos (Estado) e os governados (povos). No nosso país, onde quase tudo se passa em termos de seguidismo e imitação e, sobretudo, em escalas menores, temos, além disso, sido confrontados com terríveis dislates,  protagonizados por figuras com o maior destaque empresarial  e que nos surpreenderam (aos inocentes, claro) com as mais torpes vilanias,  pelas quais alguns acabaram ou acabarão por ser acusados embora, para nossa surpresa, as suas áureas de influência ainda não se tenham extinguido por completo. Andam, claro, às voltas com os sempre legais recursos jurídicos que hão-de conduzir até à eternidade das suas existências, sempre sob a capa dos mais ilustres advogados que são pagos a peso de ouro, ouro este vindo sabe-se lá de onde…

Mas voltemos a Pierre Musso. É agora que surge o novíssimo acrónimo BTM que significa, muito simplesmente, Berlusconi, Trump, Macron. Embora tratando-se de personalidades distintas, acabam por se assemelhar no essencial: no arquétipo do político-empresário que tem invadido, lentamente, o nosso ocidente democrático. Na perspetiva histórica da sua dissertação, Musso (que relembra a guerra secular entre a Igreja e o Estado) vai buscar estas figuras a três origens diferentes: Itália, América e França. Com muita oportunidade histórica refere que quase tudo começa, normalmente, em Itália:  do Império Romano às cidades-estado, até ao fascismo e, pela eterna desconfiança deste povo em relação ao Estado, surge a figura do empresário-político que usa o estado a seu favor mas o atraiçoa em permanência. Os jornalistas americanos já inventaram o termo  “Trumposconi” para descreverem o que de mais abjeto tem acontecido à política tradicional americana e cujos efeitos são tão difíceis de combater. Mas ao surgir Macron em França, um antigo ministro socialista das finanças francesas não se coibe de dizer que “o macronismo é o casamento da tecnocracia com a aristocracia financeira”.  Passa-se, assim, do “governo dos homens para a administração das coisas”. E é por isso, no preenchimento desse vazio de relacionamento,  que surgem, alegando também as desigualdades de vida que decorrem deste novo sistema, os famosos “coletes amarelos” que se deixaram, infelizmente, submergir pelos gangues contratados pelos extremismos, criando-se um clima de desordem social que Macron já apelidou de “destruição da República”.

Mas quando as  sociedades se confrontam com as trágicas realidades do nosso mundo (migrações, acidentes climáticos, rivalidades imperialistas entre grandes potências) aí o populismo aproveita-se das eventuais ruinas dos governos que ele próprio destruiu. Matteo Renzi serviu de modelo a Macron. A Itália, como sempre…  Mas agora a missão nacional e europeia de ocupar, de novo, o centro das políticas, por parte da França, é muito mais complexa e imprevisível.  E o “raio” do Brexit não veio ajudar nada…

Como diz Marielle de Sarnez, Presidente da comissão de negócios estrangeiros da Assembleia Nacional Francesa,  “É preciso que a Europa comece a fazer política!”

Para que não se ponha em risco a democracia, já tão abalada por esse mundo fora.

 

Um pensamento sobre “Políticos e Empresários

  1. Um assunto muito pertinente, se nos debruçarmos sobre os tempos incertos, que hoje estamos a viver…! A promiscuidade da política e dos interesses das grandes empresas, sempre sujeitas aos favores, para não se deixarem tombar, no campo de batalha da globalização… ! O jogo do puxa-empurra, com a balança de pagamentos. A perspectiva demoníaca, do desemprego de massas. As importações e as exportações. Os déficites e os superávites. O jogo das agências de rating, favorecendo sempre determinado tipo de prestamistas internacionais…! A preocupação de não perder votos a favor das oposições. A informação e a desinformação, a minar a realidade. As locomotivas do desenvolvimento, assim chamadas em tempos, a perderem a força do vapor, por acção da concorrência desigual. Um mundo, cada vez mais pequeno, onde as distâncias já não são tidas em conta, com a notícia do último minuto, a entrar-nos em casa, sem ter que bater à porta…! Um mundo, que nunca viveu tão bem, com centenas de milhões de pessoas, de ambos os hemisférios, a deslocarem-se, gozando umas férias há tanto desejadas. Um mundo, que de tempos em tempos, tropeça e mergulha na escuridão do desconhecido…!

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