Olá, leitores amigos do nosso blogue. Cá estamos de novo depois de algum tempo de silêncio. Não, não desistimos do nosso projeto mas os últimos tempos têm sido adversos para a frequência dos nossos textos. Por razões específicas (como poderão ter visto anteriormente), aumentadas por uma incapacitante, embora temporária, imobilização do braço direito (nada que o tempo não resolva); e por razões alargadas e genéricas que têm a ver, evidentemente, com o confinamento a que todos nos sujeitamos. Este recolhimento não nos impedirá, fisicamente, de escrever, mas havemos de concordar que nos limita a vontade e amortece o entusiasmo que sempre nos anima. É como se estivéssemos em guerra: ocupamo-nos, todos, com o essencial para existir, deixando de ver amigos, familiares, o mundo de uma forma geral. Esse mundo chega-nos apenas através de noticiários acabrunhantes, dolorosamente excessivos em pormenores de dor e sofrimento. Com apontamentos e relatos completamente inúteis. Arrasta-se por mais de uma hora o que podia ser dito e relatado em metade do tempo. E é pena, porque tresanda a despesas supérfluas e incompetência jornalística. Sabemos de conhecidos ou amigos que partem no meio desta turbulência e acredito que todos pensemos na pressão do nosso próprio quotidiano. Nada do que entra nos noticiários a que temos acesso, sem sair de casa, nos tem trazido um fôlego de tranquilidade e repouso. Pelo contrário, tudo o que nos envolve nos faz lembrar a “Guernica” de Picasso: a guerra em todo o seu esplendor. Sim, porque é de guerra que se trata. Estamos a vivê-la como, nas gerações mais recentes, nunca tinha sido vivida. Aguarda-se pela vacina quase como se fosse a “bomba atómica” que levou à capitulação e ao fim da II Guerra Mundial.
E nesta guerra temporal em que estamos envolvidos vamos olhando em volta e apreciando os despojos do que temos feito ou vivido. Cada um guarda os seus, embora as alternativas não sejam muito variadas. Ganhámos tempo para falar (só telefonicamente, claro) com os amigos que, por vezes, eram difíceis de encontrar. Estão todos em casa, a fazer o mesmo que nós. Também telefonam , claro, (para enorme alegria e reconhecimento das operadoras) e percorrem os mesmos caminhos do isolamento. As casas, mesmo para os que trabalham ativamente (e há muitos, felizmente), transformaram-se um pouco em abrigos de guerra. Amontoam-se os livros já lidos ou por ler, quase se “entopem” os canais de video, descobrem-se novos cantores e orquestras, revêem-se quase todos os clássicos para os quais não tínhamos, muitas vezes, todo o tempo para lhes dedicar. Reviram-se vidas. Apesar de toda esta parafrenália de limitações poderão, talvez, retirar-se algumas lições importantes. A primeira é a de que, de uma forma geral, toda a humanidade passou a ser mais contida nos seus hábitos: passou a abdicar ou a secundarizar o supérfluo. A segunda é a de que o ser humano não controla o mundo, muito menos o universo. Este vírus, tal como milhões de outros que se conhecem ou estão por conhecer, transformam-nos e derrotam-nos de forma súbita e inesperada. Outra lição é a de que se torna cada vez mais urgente a humanidade valorizar-se em todos os seus domínios: da cultura e desporto, da ciência, das artes, das humanidades, para prevenir futuras e inevitáveis crises e, sobretudo, ter a capacidade de melhor as enfrentar e ultrapassar.
Desta terrível pandemia restam-nos os nossos despojos de guerra mas nunca reaveremos todos os que a pandemia levou. Resta-nos a força, a resistência e a esperança. Muita esperança.