A Obstipação do Canal

A obstipação é um padecimento muito desconfortável e desagradável que, não desdenhando idades, se torna mais frequente nas idades mais avançadas se não forem tomados os cuidados convenientes. Esta analogia prende-se, naturalmente, com o famoso canal do Suez pelo qual transita cerca de 12% do comércio global atual. Talvez não tenham sido tomados os tais cuidados convenientes mas o certo é que, bem recentemente, no dia 23 de Março, um cargueiro com a bandeira do seu armador de Taiwan, Evergreen, com o interessante comprimento de cerca de 400 metros (praticamente a mesma altura do Empire State Building), encalhou no célebre canal, atravessando-se por completo e causando um entupimento definitivo (a tal obstipação) que só poderia terminar com o seu desencalhe e retirada do local. Segundo os peritos, tudo se assemelhava muito a um arranha-céus deitado por terra com milhares de toneladas de produtos depositados em milhares de contentores. Não se pense que é caso único neste canal. Muitos outros navios por ali transitam com as mesmas características de comprimento e tonelagem. Mas desta vez, segundo o comandante e alguns peritos locais, ventos fortíssimos de terra terão contribuido para um inevitável encalhe. As opiniões não foram unânimes mas o que era indispensável era aliviar a “obstipação” e permitir que os restantes 437 navios que já se encontravam em espera pudessem também passar. Sem nos esquecermos que, segundo as declarações do presidente egípcio Sissi (não tem nenhum antecedente familiar com a tão famosa imperatriz Sissi da Áustria, esposa do imperador Francisco José I, que deliciou as nossa tardes de cinema de há muitos anos quando a vimos na expressão angelical da atriz alemã Romy Schneider) o entupimento privavava o seu país de taxas diárias da ordem dos 14 a 15 milhões de dólares.

Era indispensável remover o navio e repor a ciculação no canal. E, para resolver o assunto desta tremenda obstipação, apareceram os mais notáveis peritos mundiais, os holandeses, a quem já chamam de “agiolaxes ou dulcolaxes mundiais”, com o inconveniente do dulcolax ser aplicado em supositórios… Para além desta analogia brejeira, o certo é que compareceram no local, rapidamente, cerca de 14 rebocadores de alta potência e potentíssimas máquinas de dragagem que conseguiram remover , em pouco tempo, cerca de 27.000 toneladas de areia da zona em que se encontrava o cargueiro. E esperaram pelas condições ideais, pelo trabalho infernal dos rebocadores mas, sobretudo, à altíssima maré que a lua egípcia lhes poderia facultar a curto prazo. E facultou. A Iah (lua segundo a mitologia egípcia), e todos os deuses que a circundam, ajudaram ao desencalhe tão esperado permitindo ao Sissi, em menos de uma semana, passar de novo a receber as suas milionárias taxas diárias com o trânsito dos navios que continuaram a passar tranquilamente.

Não se pense que estes acidentes são raros. O próprio Evergreen já tinha estado envolvido num acidente do género, em 2019, e no Pacífico Norte, nos dois primeiros meses de 2021 perderam-se 3000 contentores com todos os bens que por eles transitavam. As seguradoras não andam, naturalmente, afastadas destes problemas e muitas das atribulações que têm a ver com o comércio marítimo dariam (e sempre deram) “conversas para muitas mangas”.

Situemo-nos, por hoje, nos aspetos preventivos das “obstipações” e nas fortunas arrecadadas pelos “agiolaxes” holandeses que se especializaram, há muito, nesta já tão famosa patologia.

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