O ALGARVE NÃO É SÓ PAISAGEM

O Algarve sempre foi para o resto do país uma zona limítrofe, lá para o sul, onde as gentes eram “amoiradas”, morenas “com ares de marraquexe”, velhas conquistas dos reis D. Sancho II e D. Afonso III ao califado da moirama. Essa união mais tardia, relativamente ao resto de Portugal, manteve, durante séculos, um misterioso ambiente de exotismo, de território excêntrico mas apelativo. Por isso as gentes dos Algarves sempre foram muito “senhoras do seu nariz”, em contraponto ao distanciamento e basófia com que eram tratados pelos “impiedosos nortistas”. Isso já acabou tudo. O mar foi sempre a fronteira e o lavar das almas algarvias. As pescas que, durante muitos anos, alimentaram o dia a dia dos nativos, sempre procuraram proteção, para as suas espinhosas noitadas no mar, de muitas Santas e Padroeiros que ainda hoje merecem a devoção das suas gentes ao longo da costa algarvia.

Mas 1500 veio mostrar ao mundo que o mar não era fronteira nem fim. Pelo contrário, foi escola de saber e de partida para todas as regiões do mundo. Foram por lá concebidos, na Ponta de Sagres, os métodos, os planos de viagem, os instrumentos, as gloriosas embarcações que se fizeram ao mundo e levaram “um cheirinho do Algarve” aos extremos conhecidos e não conhecidos das civilizações.

Miguel Torga que escreveu e rimou primorosamento sobre a sua paixão de viajar disse, curiosamente, num dos seus escritos: “Conheço bem o meu país mas é a primeira vez que venho ao Algarve. Ao debruçar-me sobre o Caldeirão dei-me conta de que tudo aquilo era diferente do norte duro e agreste a que me habituei. Não deixa de ser curioso. Mas tudo isto, mais uma vez, já lá vai.

A realidade algarvia é hoje bastante diferente do atraso que se lhe atribuiu durante séculos. Alguns exemplos atuais merecem ser relevados. Em Alcoutim, mais concretamente em Martim Longo, está a funcionar a maior central solar do país, a maior da Europa não subsidiada. Tem 660 mil painéis com uma potência total instalada de 219 MW. Evita, anualmente, a emissão de 117 mil toneladas de CO2 e permite o abastecimento de eletricidade ao equivalente a 200.000 habitações.

Mas há mais: em Castro Marim uma empresa portuguesa dedica-se à produção de cannabis medicinal prevendo, no seu desenvolvimento, um investimento global de 30 milhões de Euros até 2026, criando cerca de 300 postos de trabalho.

Com a iniciativa e apoio do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve vai ser criado, entre o farol de Alfanzina e a zona oeste de Albufeira, a maior zona de biodiversidade marítima na costa portuguesa. Com uma área de mar de aproximadamente 156 km2 vai-se chamar Parque Natural do Recife do Algarve e irá funcionar como um “santuário” marinho abrigando milhares de espécies, a salvo das lides da pescaria. O empreendimento é também patrocinado pela Fundação Oceano Azul. Fará parte de um conjunto mundial de reservas marítimas para estudo e perservação de espécies que podem correr riscos de sobrevivência ou desaparecimento. Em termos agrícolas o Algarve continua a produzir e exportar produtos de grande qualidade como a laranja, a batata doce, a amêndoa, o agrião e o amendoim. É bom relembrar que, segundo as últimas estatísticas, a economia do mar corresponde a 5% do PIB nacional e que emprega cerca de 4% de trabalhadores portugueses.

Tudo isto se deve ao enorme incremento da Universidade do Algarve que apresenta, pelo segundo ano seguido, uma taxa de colocação superior à média nacional. As vagas nesta universidade têm aumentado todos os anos e, este ano, para o Concurso Nacional de Acesso, ainda estão disponíveis 197 vagas (as maiores dos últimos 30 anos). Sem falar nas indústrias tradicionais de exploração do sal marinho, da alfarroba e de tantos outros produtos naturais ou transformados o Algarve apresenta atualmente uma diversidade industrial muito valiosa que substituiu a atividade tradicional das conservas de peixe que, apesar de tudo, ainda se mantém.

Mas também na área cultural o Algarve não se atrasou. Dispõe de uma Orquestra Sinfónica, com sede em Faro, que envolve também uma academia de formação musical em música clássica e outras, para portugueses e estrangeiros (que já são muitos). São frequentes os seus concertos no Algarve e em todo o país. O Teatro tem também uma expressão local muito significativa. A Cultura é, pois, como se vê, uma aposta forte da região.

O Algarve baseia grande parte das suas receitas nas atividades turísticas. Muitos articulistas habituaram-se a dizer que Algarve é o Turismo e nada mais. Não é correto pelos poucos exemplos que damos atrás. Mas se atendermos à variedade turística que, na realidade, o Algarve oferece concluiremos que se trata de uma zona privilegiada em termos nacionais e internacionais. Muitos amigos meus fazem alarde de ter ido a Cuba e terem estado na praia de Varadero. Também já lá estive mas era bom que se atendesse à enorme qualidade que temos à disposição nas nossa terras algarvias.

Não, meus amigos, o Algarve não é só paisagem.

Um pensamento sobre “O ALGARVE NÃO É SÓ PAISAGEM

  1. Manuel José, tens muita razão em chamar atenção para a importância do Algarve, para alem da actividade turística. Pela parte que me toca, quando passo dias de férias no Algarve, a praia é a menor das minhas preocupações. Gosto especialmente de Tavira e da sua envolvente

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