De quando em quando somos surpreendidos pela erupção de mais um vulcão, algures no mundo. Os meios existentes permitem-nos ver esses fenómenos praticamente em direto, transmitindo-nos a beleza e o terror do local. Nessas alturas pensamos um pouco mais no assunto e o que ele significa em termos do planeta em que vivemos. Lembramo-nos, então, que o planeta está vivo, em constante atividade interior e, de quando em vez, as magnitudes das suas forças não podem ser contidas e as terríveis massas de fogo, de materiais em fogo, são expelidos para o exterior e destroem, com a sua força indomável, tudo o que se lhe opuser. É um espetáculo maravilhosamente aterrador. É a magia do que nem sempre nos lembramos a fazer-se ouvir para que não a esqueçamos. Ficamos sempre a pensar que nunca nenhum de nós está livre de ter uma vizinhança dessas. Com mais ou menos probabilidades mas não podemos esquecer que “as coisas lá por baixo estão sempre a mexer-se”.
O vulcão da Ilha de Las Palmas, nas Canárias, iniciou as suas erupções a 19 de Setembro de 2020 e, até hoje, ainda não pararam nem diminuíram de intensidade. Pelo contrário, a intensidade das suas projeções de lava tem aumentado e as toneladas de detritos, a milhares de graus de temperatura, têm criado novos rios de terror que escorrem, desde os 1949 metros das crateras do vulcão, até ao mar, dizimando tudo o que vão encontrando pelo caminho. Tudo o que está vivo desaparece, fica soterrado na amálgama da massa que continua a fluir e que, quando chega ao mar, em contacto com a água, produz gases e nuvens de apocalipse que atormentam os milhares que ali viviam em paz e tinham as suas vidas consolidadas. Este vulcão já teve, no entanto, anteriores emanações. Desde 1470, praticamente com uma periodicidade secular, ele faz-se lembrar e vem recordar os tumultos que permanecem nos interiores profundos da Terra (1585, 1677, 1712, 1949, 1971, 2021). Para as gerações que estão a viver esta saga estão também a viver o que, possivelmente, tiveram de pior nas suas vidas.
O que se está a passar em Lá Palma faz-me lembrar o que se passou com o vulcão dos Capelinhos, na ilha do Faial, em 1957. Chamava-se e chama-se local Península do Capelo onde existia um farol (Farol dos Capelinhos) , tendo em frente, não longe de terra, os ilhéus dos Capelinhos. A ilha foi nessa altura atormentada por cerca de 200 sismos e a erupção durou desde 27/9/1957 até 24/10/1958. Foi já em Maio de 1958 que um navio da Armada portuguesa, no qual me encontrava embarcado, foi desviado do seu percurso programado para ir apoiar, no que fosse possível, as forças locais de controlo do fenómeno. O apoio não foi muito prolongado porque a situação estava já a decrescer em intensidade. Mas tivemos oportunidade de caminhar sobre as camadas espessas de poeiras vulcânicas, passando por chaminés de casas que se encontravam já soterradas e cuja população tinha sido retirada. A área total da ilha é de aproximadamente 171 km2 e, com a expulsão da lava, essa área aumentou no local cerca de 2,4 km2. Esta área foi reduzida cerca de 1/3 devido à erosão marítima e ambiental. Nada que se compare, claro, com os 43 hectares que La Palma já se viu, infelizmente e até agora aumentar, sem saber como e quando o fenómeno acabará.

Na nossa viagem aos Capelinhos a magia do vulcão levou-nos a tentar espreitar e admirar o interior da cratera com a lava incandescente que de lá era projetada. Coisas que se fazem em certas idades da vida, com alguma insensatez, o que nos permitiu, no entanto, reter imagens em direto que, para nós não se repetirão. Aqui fica o comprovativo dessa nossa aventura inesquecível.
As repetições destes fenómenos lembram-nos sempre a precariedade da vida e como a Natureza nos pode surpreender com as suas terríveis magias. Belas como imagens, dolorosas nas suas consequências. E o curioso é que, na sofreguidão das notícias diárias, o terror da La Palma continua sem que quase dele se fale. Hoje mesmo, por coincidência , regressaram mais terríveis notícias de aumento de atividade vulcânica e de mais áreas e gentes afetadas.
Não podemos , no entanto, esquecer que, por todo o mundo existem em atividade permanente mais de 10 vulcões, mesmo no continente em que vivemos, a Europa. É pena que não possamos fazer as pazes com o planeta para que não se vivam estas tragédias. Tentemos a solidariedade e o auxílio internacional a quem sofre ou pode vir a sofrer este flagelo.