Como saberão estou há muitos anos ligados às causas do Desporto. Mantenho ainda, em algumas instituições desportivas , lugares de jubilação de que muito me orgulho. Nos estatutos de um Clube a que pertenço há muitos anos lê-se uma frase exemplar : O Desporto pelo Desporto. Frase que se repete hoje vezes sem conta, na maior parte delas para abrilhantar comportamentos ou fazer passar ideias. O Clube a que me referi fá-lo estatutariamente, cumpre com as normas do amadorismo, recebendo, no entanto, no seu seio, organizações e atletas que optaram pela prática profissional. Mas o Clube, por si, mantém atividades de ensino e competição que são exemplo educativo em termos nacionais. Foi o introdutor do Futebol em Portugal, imagine-se, em 1897, mantém essa modalidade em termos de um campeonato interno amador, para além de ter desenvolvido o ténis, o padel e algumas modalidades de pavilhão. Sem que as suas condições de vida fossem alguma vez afetadas. Trata-se, claro, do CIF, instituição que já aqui abordei em textos anteriores.
Embora a minha prática desportiva se tenha, ao longo dos anos, repartido modestamente por diversas modalidades foi, no entanto, em termos de dirigismo, a modalidade do Ténis que mais anos me ocupou. Olho para todas as modalidades com o mesmo respeito e aprecio os grandes feitos dos campeões profissionais. E fico gratitificado qundo percebo que, para além do inevitável e incontornável profissionalismo que envolve e faz progredir os atletas, sinto que a ética desportiva (o tal fair-play) como tantas vezes se diz, é respeitada e conseguida pelos exemplos dos melhores. NÃO à indisciplina, NÃO à dopagem, NÃO aos resultados combinados, NÃO às gestões absurdas e criminosas, NÃO ao enxame de figuras que deturpam as realidades e os comportamentos desportivos. Estas são regras básicas para que sempre se possa falar do “Desporto pelo Desporto” , a essência crucial para que se continue a amar o Desporto e a fazer dele, como dever ser, uma enorme escola de vida e de atração para toda a juventude. Felizmente há muito dirigismo com mérito, com provas dadas, com entrega total às suas missões e é a ele que devemos pedir e exigir o controlo da correção desportiva.
O desabafo desta introdução vem a propósito do recente caso do tenista Novak Djokovic e da sua possível participação no Torneio ATP de Melbourne. É o número 1 mundial, nas escalas classificativas determinadas pela organização competente, e pretende participar neste torneio para manter essa posição e superar alguns desempenhos históricos de antecessores seus. Admiro os seus feitos desportivos desde há muito embora lhe reconheça, de quando em quando, apontamentos de crispação e de arrogância, relativamente a colegas seus de profissão, que deixam, desnecessariamente, alguns rastos de amargura.
O caso de Melbourne traz à colação um conjunto de considerações que têm sido comentadas praticamente em todo o mundo desportivo. A atual pandemia de covid tem imposto comportamentos e atitudes muito cautelosas praticamente a todos os países do mundo. A Austrália não foi exceção. Os seus cidadãos vivendo no exterior têm sido privados de entrar no seu país para se juntarem às famílias pelo impedimento legal imposto. Novak Djokovic opõe-se à vacina contra a covid por razões pessoais que os seus mais próximos deverão conhecer. Não é caso único. Em todos os países, incluindo Portugal, existem negacionistas que não seguem as recomendações da Ciência e entendem seguir um comportamento cujas razões variam mas sempre pouco claras. A Austrália e a organização deste Torneio exigem que todos os que entrarem no país deverão estar vacinados. Novak não aceitou e procurou entrar. Dispunha, segundo se diz, de um documento do seu médico reclamando uma situação de exceção pelo facto de ele já ter contraido a doença e ter-se resguardado durante um determinado período. Existem, no entanto, reportagens que o apresentam em visitas a escolas, no meio de imensas crianças, sem uso de máscaras. Aparente contradição, presume-se. Os documentos que apresentou na fronteira não foram aceites pelos australianos e o visto foi-lhe retirado. Como se recusou a sair do país ficou confinado num hotel destinado a esse fim. Iniciaram-se os processos legais do costume e um tribunal de primeira instância de Melbourne decidiu a libertação imediata do sérvio. Os meios de comunicação sérvia e os grupos ligados ao atleta pronunciaram-se de imediato sobre a “vitória da libertação”, uma vitória legal da Sérvia. O Ministro da Imigração australiano não é, no entanto, da mesma opinião e vai utilizar o seu “poder pessoal de anulação” de acordo com o artigo 133C do Regulamento oficial. A luta vai continuar. A mãe de Novak já afirmou que, se necessário, fará um pedido à Rainha de Inglaterra e da Comunidade para intervir no assunto. A política tomou conta do diferendo desportivo. A Sérvia está em guerra judicial com a Austrália. É a negação do tal princípio do “Desporto pelo Desporto”. Não se conhece ainda o desfecho deste incidente mas o mundo do ténis, de todos os que fizeram prova de estarem vacinados para entraram legalmente no país, interroga-se sobre este comportamento e sobre os efeitos que, a prazo, poderão atingir o mundo desportivo já tão afligido por causas de arrepiante controvérsia. Antigos e atuais praticantes, como Martina Navratilova e Rafael Nadal, dizem “apreciar Novak mas não podem defender a sua opção de não ser vacinado”. Por outro lado o tenista Andy Murray já se confrontou nas redes sociais com o célebre político do Brexit, Nigel Farage, que aprovou a decisão do tribunal ao libertar Novak, contradizendo dessa forma a sua mundialmente famosa política de restrições duras à imigração que agora, inesperadamente, rejeita.
Enfim, acabe como acabar este caso, estamos perante um triste exemplo de comportamento tão usual entre os grandes campeões profissionais de muitas modalidades e os milhões de adeptos que os seguem e apreciam. É a “fama dos triliões” que macula o Desporto na sua relação com o mundo real. E a política, como em tantas outras ocasiões, entra na disputa, sem capacidade de medear ou apaziguar situações que devem ser rejeitadas a bem do Desporto.
Por isso comecei por invocar a regra do “Desporto pelo Desporto”. Mesmo ultrapassando o amadorismo, o Desporto profissional deve ser praticado e defendido por “cavalheiros” (abrangendo os dois géneros, claro, para evitar utilizar o termo “damas”).
Ainda não me tinha debruçado inteiramente sobre o assunto, por razões de saturação, tal a enormidade de situações incompreensíveis sobre os negativismos que se nos atravessam pela frente. Vivemos num mundo às avessas…! E esta apreciação, foi bastante elucidativa, face aos inúmeros comentários pouco esclarecedores e tendenciosos, que a maioria dos noticiários inundam os nossos tempos de leitura. Infelizmente, o desporto entrou numa fase de aproveitamentos para se fazerem valer outros valores que não correspondem em nada ao saudável espírito de competição.
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Excelente apreciação, regras são regras e devem ser cumpridas por todos, mal vai o mundo quando se abrem excepções para os mais fortes.
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Falou/escreveu um CIFISTA. Assino por baixo. Abraço do consocio
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