O termo Amizade talvez seja fácil de definir em termos gramaticais mas mais difícil de interpretar em termos práticos da vida real. Não me interessa particularmente enveredar pelas raízes históricas ou ortográficas da palavra, mas mais tentar compreender o que para cada um de nós a Amizade pode significar no mundo de relações que, ao longo da vida, se vão criando.

Todos, de uma forma geral, temos Amigos, mantemos Amizades cujas classificações são, no entanto, distintas. Dizia-se, na altura dos meus quarenta anos, que quem não fizesse amigos até essa altura nunca mais os faria. A vida ensinou- me que esse prognóstico talvez seja verdadeiro. E nesta fase da vida em que como dizia o Sinatra na sua canção “My Way” : And now, the end is near/And so I face the final curtain” , olho à minha volta e encontro, felizmente, uma série de Amigos de longa data, em quem sempre confiei e em quem continuarei a confiar até à tal “final curtain “. Esses são os amigos que, talvez vendo-se pouco, reagem a ocasional contacto como se se tivessem visto na véspera. As amizades são, no entanto, mais amplas. Contam os que ainda nos respondem e contam os que já partiram e dos quais guardamos as memórias de belos e alegres relacionamentos ou de sábios conselhos ou opiniões.

Todas essas Amizades vêm dos tempos da escola, da adolescência, das “tropas”, das profissões. E há que distinguir aqui a diferença essencial entre Amizade e Paixão ou Amor, que se situam em amplexos diferentes, emoções humanas que surgem e com as quais cada um lida “à sua maneira”. A verdadeira amizade é como uma pedra preciosa que devemos preservar e por ela dar tudo o que podemos: retribuir a nossa amizade. Há amizades temporãs e amizades superficiais, estas sujeitas a amuos incompreensíveis quando uma das partes nem sequer percebe a razão que leva a outra parte a esse afastamento. Às vezes breve mas denunciador de intempéries aleatórias às quais uma verdadeira amizade deve resistir.

Seria longa a relação de Amizades históricas, entre personagens da cultura, da política, do desporto, comuns em todos os estratos sociais e em toda a escala da riqueza e da pobreza humanas. Ser-se fiel a uma amizade é uma cultura espiritual, é uma acto de entendimento e de compreensão, de solidariedade e de partilha. É poder contar com quem se pode contar, é poder ser feliz com os próximos de quem somos amigos. É a capacidade de interiorizar o imenso e eterno desgosto quando uma dessas amizades desaparece. É a nossa capacidade de a manter viva e de continuarmos a ouvi-la quando dela precisamos.

É fácil falar de Amizade? Não me parece. As paixões e ambientes familiares, quando são harmoniosas, atenuam um pouco o mundo das nossas amizades. Mas, na verdade, nunca as eliminam. São mundos solidários embora separados. Ser amigo de alguém é uma realidade natural, tranquila mas corajosa.

As “amizades” políticas hoje tão divulgadas nas plataformas sociais não passam, todos o sabemos, de meros entendimentos ocasionais que servem, sobretudo, para os interesses de uns e as desgraças de outros. Isso não são amizades, são obscenidades que percorrem o mundo e desprezam as verdadeiras amizades.

As amizades a que me refiro são as das pessoas simples , que são assim e sempre o serão. Porque não sabem ser de outra maneira. Afinal falar de Amizade não é coisa que se esgote num pequeno texto. É muito maior que isso.