
Lembras-te ? Era um dia cheio de luz…! Ao longe, algumas nuvens brancas espreitavam o sossego do campo onde se ouvia os chamamentos das aves, trazida pela aragem vinda de Sul.
Recordo bem ! Era a Primavera… ! Lentamente aproximei-me de ti, ali sentada naquele banco do jardim, onde calmamente costumavas ler os teus livros preferidos…! Olhavas fixamente para longe, para um lugar mais a Norte, onde tantos aviões deixavam o seu rasto branco, cruzando-se com o horizonte. Já algumas vezes, por lá passáramos a caminho de Inglaterra. Curiosamente, eu tentava saber em que pensavas e para onde dirigias o teu olhar perdido naquele curto céu, ao longe, entre aquelas árvores ondulantes.
Interrompi os teus pensamentos e dirigiste-me um sorriso em troca da minha surpresa…! Rimo-nos pela minha falta de jeito. Aquele raminho de flores silvestres de cor azul intenso, descuidadamente amachucadas, que eu apanhara e tanto apreciavas, marcava o início de uma nova conversa, como se fossemos ainda namorados. Sentei-me ao teu lado, como tantas vezes fizéramos, conversando sobre tantos assuntos que nos preocupavam do dia a dia. Pequenos novos projectos que nos preenchiam a vida. Fugas, que nos alimentavam a alma e nos davam ânimo para enfrentar os anos que se aproximavam vertiginosamente, trazendo-nos mais rugas, que nunca seriam apenas as de expressão.
Uma aragem mais fresca, fazia ondular o teu chapéu de palha, e anunciava o começo do fim da tarde, com o Sol ainda a aquecer os nossos rostos. O Sol, já não muito alto, começava a ficar envolvido por uma névoa que nos fazia lembrar um horizonte de fogo.
Lembrava-te o Por de Sol algarvio, que tantas vezes admirámos juntos, na Ilha de Tavira, entre as dunas e as suaves ondas atiradas preguiçosamente de barlavento.
Sabes ? Muitas vezes, sento-me naquele nosso banco, e deixo correr aquela mesma aragem pelo rosto, como se estivesses a sorrir das minhas imaginações. As cigarras e as aves, já pouco as ouço. Já nem o pica-pau, a tamborilar nos choupos do vale me impressiona. Talvez mais, os melros, no seu grito forte e atrevido de sempre…!