Muitos ficarão surpreendidos com o meu texto de hoje. Não é meu hábito entrar pelos difíceis caminhos da religiosidade para os quais não estou, naturalmente, habilitado. Mas devo confessar que vi com interesse as cerimónias da visita papal a Fátima e o que, em minha opinião, me foi permitido entender.
Fátima é um fenómeno com múltiplas explicações. Como de uma forma geral todos dizem: ou se acredita ou não se acredita. Não é nesse ponto que me quero colocar. Interessou-me mais tentar perceber o sentido profundo das emoções a que assisti. Ouvi com curiosidade o que teve para nos dizer a “Opinião mais poderosa do mundo atual”. Sem tropas, sem armas, sobra-lhe o poder da palavra de Homem. As mensagens de Francisco são há muito entendidas como transversais na sociedade. Alerta para as desigualdades, para as injustiças, para o abandono, para a pobreza, para a falta de solidariedade, para as angústias dos povos. Estes são temas que percorrem todas as sociedades. Não nos fixemos na espuma dos acontecimentos, na extraordinária realização mediática de todas as cerimónias em Fátima, nas novidades que foram agora criadas para estas comemorações. O que verdadeiramente retive de tudo o que vi foi, para além das cuidadosas mas audaciosas palavras do Papa, o mar de velas na noite de 12 e o mar de lenços brancos na manhã de 13. Por detrás dessas velas e desses lenços estão rostos. Novos, velhos, angustiados, tranquilos, sofridos, espectantes. Rostos de gente que espera e tem esperança de que alguma coisa melhore para si ou para os seus. E por isso vão lá. E vêm de todo o mundo (este ano de 58 países, se não me engano) e dizem, quando interrogados, que têm fé. Talvez, mas a angústia difusa da vida conduz à sublimação dos sentimentos. Também há os que lá vão como turistas religiosos. Há de tudo. E por isso, como disse no princípio, fico mais desperto para a palavra e a solidariedade dos homens, para o exemplo que podem dar como cidadãos e indiscutivelmente parceiros em sociedades que se pretendem justas e progressivas.
Nestas ocasiões procuro e recordo personalidades que, ao longo da sua vida, tenham suscitado o apoio e aprovação de todo o mundo. Lembro-me sempre de dois: Gandhi e Mandela. A força da opinião desses Homens foi um extraordinário exemplo de luta por ideais, por princípios, em prol das suas comunidades. Há quase que uma religiosidade nas suas vidas. Como na vida de Francisco há, evidentemente, uma enorme humanidade.
Acho que foi bom para Fátima a visita de Francisco.
Não posso deixar de dizer, o quanto gostei de ler este texto de opinião. A emoção que eu senti, foi sensivelmente a mesma. E tenho a certeza, de que todo o cidadão, mesmo o não muito crente destes mistérios da vida divina, como eu, se sentiu quase esmagado, pela sobriedade, pelo civismo e pela fé de tanto ser humano, juntos para a oração a uma figura divina em que acreditam, e lhe pedem perdão pelos seus pecados terrenos e ajuda para encontrarem o bom caminho para a eternidade das suas boas almas. Talvez mais, ainda, pela saúde e felicidade dos seus. Fátima, desde que me conheço, tem sido sempre um lugar de respeito. De respeito pela fé dos outros. Da expiação de pecados, que humanamente nos vamos esquecendo de que somos cheios de fragilidades e voltamos a pecar nas mais pequenas coisas da vida. Somos assim…! Recordo-me muito bem, quantos cânticos se registaram na minha memoria, quando levado pela minha mãe, junto de meus irmãos, rezámos, seguindo as continhas dos Terços, feitos em prata, que meus pais nos tinham comprado nas fileiras de bancas dos feirantes. Aquelas chuvas miudinhas de Maio, por vezes mais atrevida, que nos encharcava as gabardines. Os chapéus de chuva, negros, encostados uns aos outros, a despejarem água pelas pontas das varetas sobre os nossos ombros. O zurrar dos burros, pela madrugada, que transportavam os sacos e os alforges do povo mais humilde, das cercanías. Os automóveis alinhados no parque do ACP. O café ou chocolate quente, de alguém que se aproveitava para fazer negócio. O caldo verde com uma rodela de chouriço para aquecer o estômago, de uma banca iluminada por um Petromax. Eram sempre estes pormenores, que nos levavam a grandes conversas, entre amigos, aparte as cenas litúrgicas do rezar o Terço, o acender das velas e o pavor de alguns pequenos sustos com o incendiar dos copos de papel para protecção das velas. Era a procissão e a vigília nocturna. Eram os lenços brancos, num adeus à Virgem .Era o regresso, num tormento de curvas e estradas estreitas, cheias de camionetas de passageiros, como se dizia na época, até chegarmos a Coimbra. Era o regozijo de um dever cumprido…! Hoje, tudo é diferente ! Mas a Fé, talvez seja mais profunda, sabendo-se que muito se evoluiu no conhecimento dos povos, ao ponto de sabermos que ela é necessária como alimento do espírito humano…! E o Papa Francisco, com toda a sua bonomia, sabe bem indicar, qual é esse caminho da Paz !
GostarLiked by 1 person
Excelente texto. O blogue está enriquecido com estes comentários.
GostarGostar