A GALINHA ENCARNADA

No dia 22 de junho, há pouco mais de uma semana, a Secretária de Imprensa da Casa Branca, Sarah Sanders, foi convidada a sair de um restaurante onde jantava, chamado “The Red Hen” ( A Galinha Encarnada), situado numa pequena cidade do estado da Virginia, Lexington, pelo facto da proprietária e os seus empregados não desejarem continuar a servir a porta-voz do Presidente Trump. A proprietária do pequeno restaurante rústico, Stephanie Wilkinson, foi confrontada com os votos dos seus empregados que não queriam a presença  da Secretária, em protesto à política do Presidente de separar as crianças dos seus pais na fronteira com o México. Este pequeno incidente transformou-se num terramoto nacional, com repercussões internas  e internacionais. O restaurante teve que fechar quando,  no dia seguinte, apoiantes de Trump atacaram o pequeno edifício com ovos, pedras e dejetos.

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Os apedrejadores invocaram o facto de alguns empregados pertencerem a uma comunidade “gay”, o que era despropositado nem nunca tinha sido a base da atitude de rebelião contra a presença da Secretária no restaurante. O objetivo foi, evidentemente, protestar contra uma medida tomada pelo Presidente, mundialmente reconhecida como ofensiva para os direitos do Homem.  Os políticos americanos começaram imediatamente a defender ou atacar este tipo de procedimentos. Mas seja qual for o ponto de vista, o verdadeiro culpado encontra-se na Casa Branca.

Por outro lado, em Washington, realizou-se uma manifestação de mulheres contra a política de tolerância zero de Trump. Foram presas 575 mulheres entre as quais a atriz Susan Sarandon o que tornou o caso muito mais mediático. A galeria de atores americanos não é, propriamente, muito apreciadora de Trump e talvez o ponto mais alto desse descontentamento tenha sido a dura crítica de Robert De Niro, ne cerimónia dos Prémios Tony, no princípio do mês.

A política de Trump, errática, aparentemente ignorante mas com orientações definidas, preocupa o mundo inteiro. As suas ameaças de os Estados Unidos deixarem de ser membro da NATO, a retirada da Parceria Trans-Pacífica, o cancelamento do Acordo do Ambiente de Paris, o abandono do acordo nuclear com o Irão, a saída do Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas, a cerimónia teatral do seu encontro com o Presidente da Coreia do Norte são parcelas de um espetáculo a que o mundo assiste, perplexo e preocupado. Entende-se que estas manifestações internacionais servirão para disfarçar os fortes problemas internos que se vão amontoando,  mas será bom não esquecer que a sua continuação no cargo dependerá dos votos dos americanos e que daí decorrerão  fortes inconvenientes para todo o mundo.

Na recente visita de Emmanuel Macron à Casa Branca, Trump fez-lhe uma pergunta espantosa:  “Porque não sai da União Europeia?” E ofereceu-lhe, como contrapartida, garantias de um substancial acordo de trocas comerciais. Não se sabe, embora se calcule, qual terá sido a resposta de Macron, mas o importante é perceber até onde vai a vontade de Trump em desmantelar  as organizações internacionais dos seus aliados.

No próximo dia 16 de Julho Trump encontrar-se-á com Vladimir Putin em Helsínquia, confirmando assim o seu grande apreço pelo “czar de todas as Rússias”. Uma cimeira para a qual não existe, segundo o Secretário de Estado John  Bolton, agenda de trabalhos ainda confirmada.  À luz dos tempos atuais talvez seja interessante passarmos em revista as anteriores cimeiras realizadas entre presidentes dos Estados Unidos e lideres da Rússia ou União Soviética. Em 1943, na embaixada soviética em Teerão, reuniram-se Stalin e Roosevelt tendo em vista a abertura das novas frentes ocidentais da guerra na Europa. A agenda existia, foi cumprida e resultou. Em 1961, em Viena, Kennedy encontrou-se com Khrushchev para discutir o tão celebrado muro de Berlim. Nada se decidiu e dois anos depois estiveram à beira de uma guerra nuclear. Em 1972, em Washington, Nixon reuniu-se com Brezhnev para assinarem o famoso tratado Start-1 de limitação nuclear. Havia agenda e foi cumprida. Em 1987, em Reykyavik, teve lugar a cimeira Reagan – Gorbachev. Assinaram um histórico acordo sobre mísseis nucleares e passaram a desenvolver  uma sólida parceria diplomática. Em 1993, em Vancouver, Yeltsin reuniu-se com Clinton, assinando uma declaração conjunta para a promoção da democracia. Em 2001, na Eslovenia, Putin encontrou-se com Bush, reunião sem grandes declarações políticas, apenas com declarações de empatias pessoais. Em 2010, em Praga, encontraram-se Obama e Medvedev. Assinaram um tratado de limitação de arsenais nucleares, com declarações finais muito amistosas. O mesmo não aconteceu, seis anos depois, num rápido mas tenso encontro de Obama com Putin, durante o qual nada resolveram no que respeitava à Síria. Segue-se agora o encontro de Helsínquia de Trump com Putin. Embora não se conheça a agenda de trabalhos todo o mundo acredita que se entenderão às mil maravilhas. Vá-se lá saber porquê…

O incidente da “Galinha Encarnada” já terá sido esquecida? Putin conhece-a bem mas suspeita-se que estará muito de acordo com aqueles que apedrejaram o pequeno restaurante de Lexington.

 

(Agenda das reuniões entre Presidentes retirada do artigo de Andrew Roth e Julian Borger no Guardian de 29/6)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Um pensamento sobre “A GALINHA ENCARNADA

  1. Hoje, quando se fala ou se discute o papel da América de Trump, num mundo que pensávamos estar tranquilo, cria-se na maior parte das pessoas, um certo sobressalto. O que é que aconteceu desta vez ? Também, eu por mim falo, deixa-me bastante deprimido, pela forma de Teddy Boy, e pelo maquievelismo de um indivíduo, que sabe muito bem como se dirigir a um povo que não quer perder o seu prestígio e admiração, alcançados pela modernidade, pela tecnologia e inovação, e mais ainda pela liberdade.
    A este fenómeno, contrapôs-se a ganância do capitalismo bem centrado em Wall Street e os dissabores da intolerância racial, que sabemos nunca ter deixado de existir. O que também sabemos muito bem, e a muitos políticos americanos esquece, é que a América seria bastante insipida, sem a influência negra ou latina, não só na música, como nas artes. Estou certo, que mais de 50% do povo, sente esse efeito, o que os torna um pouco mais tolerantes.
    Ainda sobre este aspecto, gostaria de mensionar apenas dois luso-descendentes, que brilharam e o seu trabalho continua a brilhar em todos os rostos americanos, infelismente tão pouco discutidos entre nós…!
    John dos Passos ! Um excelente escritor de origem lusa, que se aventurou como condutor de ambulâncias durante a 1ª Guerra Mundial, ao lado de Ernest Hemingway, seu grande amigo e posteriormente combatente na Guerra Civil de Espanha, ao lado dos Républicanos, com histórias apaixonantes, e a sua posterior desilusão política.
    John Philip Sousa ! Outro luso-americano, que toda a América ainda hoje escuta e se apruma, ao som das suas marchas…! ” The Stars and Stripes Forever “, Quem não acompanha com o pé, ao ouvir toda aquela imensidão de som, saído do rufar cadenciado dos tambores e trombones ? E ” America First ” ,título tão apreciada por Donald Trump, certamente sem saber que foi um filho de imigrantes, que escreveu e criou todas estas marchas, como símbolos de uma América poderosa ?
    Desconheço, se o nosso tão estimado Presidente da Républica chamou a atenção de Trump, para estes dois casos singulares, além do caso Ronaldo, sabendo-se que este futebol mundial ,não faz parte das preferências desportivas norte americanos…!

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