Ontem, dia 19, ao fim de um dia cansativo de calor que não desarma, assisti inesperadamente, à reposição de um concerto executado pela London Simphony Orchestra, transmitido pela BBC em 2014. Maria João Pires, aquela figura frágil, tinha-se tornado a grande estrela da noite, que nos apetecia ver, repetidamente, sob a batuta mágica e de grande elevação, de Sir John Eliot Gardiner.
Os seus dedos, percorriam todo o teclado, arrancando as notas mais surpreendentes de Schumann, acompanhando todo o conjunto quase explosivo de uma orquestra sinfónica excelente e acarinhada por uma plateia conhecedora e exigente, que não deixava de a aplaudir.
Maria João Pires, uma artista que entre nós, nem sempre compreendida, nem a sua impreparação para pequenos grandes vôos financeiros, foram acompanhados e muito menos aconselhados.
Tive, a felicidade de conhecer pessoalmente Maria João Pires, pessoa frágil e delicada , na sua própria quinta de Belgais, pela mão de uma amiga comum. Uma obra, que se destinou a ser um lugar de acolhimento, aberto a todas as artes. O jornal Le Monde, apelidou Belgais, como ” Un monastère des pianistes ” …! Naquela noite quente, de fim de verão, como visitante, senti-me maravilhado pela beleza de uma casa térrea, rústica, cor de barro, iluminada por luzes decorativamente colocadas, onde por vezes sobressaía o verde da relva e a gentileza de alguém que me oferecia uma bebida fresca. Um pequeno oásis, onde se ouvia o som de um piano, tocando áreas de Mozart e Chopin, por alguém ensaiando um próximo espectáculo, algures, em qualquer capital da Europa…! Nada superficial…!
Belgais, um sonho tornado realidade, a vir ser desfeito por incompreensões, talvez invejas, talvez por compromissos fora de prazo, de que não me atrevo imaginar. Fico a pensar, quantas vezes agravadas por uma comunicação social, sempre ávida de notícias bombásticas para nivelar os seus cofres vazios.
Incompreensivelmente, Belgais acabou…! Os seus pianos foram arrestados por ordem judicial. Aquele Oásis, transformar-se-há num montão de ruínas, como muitas outras deste país, longe de quem os concebeu e deu tudo para que se tornasse realidade.
Maria João Pires, que tocou no Tonhalle Maag, em Zurique, no Théâtre des Champ Elysées, Albert Hall de Londres, entre tantos outras salas maravilhosas, sentindo-se cansada, deixou o país, optando pela nacionalidade brasileira, segundo se diz…! Talvez o Teatro Municipal do Rio de Janeiro, se encha consecutivamente com sessões esgotadas, para gáudio da sociedade carioca…!
Fiquei triste e não a condeno…! Somos um país assim…!
Também ouvi e vi transmissão do concerto do dia 19 e como todos os apreciadores maravilhei-me com as interpretações. Nunca tive a sorte de conhecer pessoalmente a Maria João. Tive apenas uma aproximação. O seu irmão, o Eng. Hugo Pires foi meu director na Fábrica Lever em 1968-1970
GostarLiked by 2 people
Tinha intenção de escrever sobre o mesmo tema mas faltar-me-ia o conhecimento pessoal das pessoas e do local. Desisti depois de ler este excelente texto que aprovo incondicionalmente.
GostarLiked by 1 person