Estávamos nos finais dos anos quarenta…! As imagens de uma Europa destruída, empobrecida por uma guerra estúpida, fixava-se na minha memória ainda fresca, de uma juventude despreocupada. Imagens aparecidas em revistas e nas actualidades projectadas nos cinemas, antes da passagem dos filmes que ansiávamos ver.
Dias escuros, quase iguais às noites de insónias, gente triste, encurvada pelo sofrimento, recolhendo vagarosamente, os escombros que tinham sido, talvez, as suas próprias casas. Com olhar vago, de quem já não pensava em nada, tentavam encontrar algo que tivesse ainda algum valor, mesmo que sentimental. Talvez uma foto de família desaparecida sob os bombardeamentos cegos, lançados de grande altitude…!
Foi em Dresden, como foi em Berlim e Hamburgo, como tinha já sido em Londres ou em Roterdão…! Resultados de uma beligerância difícil de compreender nos tempos de hoje, onde os povos começaram a compreender-se e a dialogar, encontrando pontos comuns de interesse em prol de uma Europa livre e mais fraterna. Os tempos continuaram a ser duros, para quem ficou e para os que regressaram dos campos de batalha, cansados, precocemente envelhecidos, ansiosos por esquecer todos aqueles anos de desconforto.
Os anos passaram, e as memórias já menos frescas, vão esquecendo com a idade, como foram todos aqueles longos dias de medo e angústia, tão diferentes dos dias de hoje, nem sempre fáceis, mas bastante mais felizes e despreocupados.
Os termos de comparação, tornam-se tão difíceis de obter, que nos confunde a realidade com a fantasia…! Quando dizemos, que estávamos felizes, longe daquele conflito, a três ou quatro dias de viagem por estrada, hoje, resume-se a duas horas e meia de viagem de avião, sem falarmos das antigas alfândegas e vistorías demoradas nas fronteiras. Quando pensamos, como era cruel e difícil, obter um simples litro de leite, ou um simples pão ou ainda a uma porção de açúcar avulso, sujeitos a senhas de racionamento, hoje, resume-se numa rápida ida a um super-mercado, recolhendo o que lhe parecer melhor…!
E o que vemos hoje em dia por esta Europa fora ? A contestação por melhores salários, para enfrentar uma carestia de vida que não para. Um aumento de impostos, para suprir as despesas de um Estado, cada vez mais deficitário, também pelas suas responsabilidades sociais. Dificuldades, sem dúvida, de muita gente que sofre com o desemprego de longa duração, motivado por crises cíclicas de difícil compreensão, de abusos dos mais poderosos, de maus resultados financeiros, ou ainda pela livre concorrência de economias continuamente débeis, estrategicamente colocadas em acordos internacionais de globalização.
O que se vê em Paris com os coletes amarelos, amanhã veremos em Lisboa, por oportunismo natural, sem se pensar que por cá, a economia está baseada em estruturas diferentes e bem mais difíceis, por erros colossais de um passado recente…! A desinformação de uma realidade, habilidosamente colocada por fake news, ou ainda a colagem de vandalismos desgarrados para empalidecer um movimento que parecia ter algumas razões…!
E esta Europa, vai endurecendo, sob a batuta de algumas lideranças mais ortodoxas, fechando-se sob a capa de um proteccionismo cultural, fazendo reviver um passado não desejado…!