Mikko Franck, maestro finlandês, dirigiu ontem, domingo, a Orquestra Filarmónica da Radio France, apresentando em estreia a peça “Duas Serenatas para Viola e Orquestra”, composta pelo mais famoso compositor finlandês do último século, Einojuhani Ruatavaara, falecido em 2016, com 87 anos. Mikko, aluno e grande amigo do compositor, tinha-lhe pedido, em 2014, se não se importaria de escrever uma nova obra para viola e orquestra, depois do clamoroso êxito alcançado pela peça “Concerto para Viola” que ele também tinha dirigido na Sala Pleyel, tendo como solista a virtuosa americana Hilary Hahn. O compositor não se recusou mas o seu tempo era pouco pelas imensas solicitações que recebia. Além disso o seu estado de saúde não era famoso, depois de uma rutura da aorta que tinha sofrido em 2003.
Mas eis que, em 2016, ocorre o falecimento do compositor. Mikko, como grande amigo da família, percorreu, durante algum tempo, na companhia da viuva, os papéis e obras dispersas de Einojuhani. E foi com grande surpresa que encontrou a primeira parte da peça que lhe tinha pedido, “Duas Serenatas para Viola e Orquestra”, que o compositor tinha iniciado sem encomenda oficial nem contrato. A obra estava incompleta: faltava-lhe a orquestração para a segunda serenata, embora a parte da viola estivesse terminada. Mikko não hesitou e pediu ao compositor também finlandês Kalevi Aho, grande conhecedor da obra de Einojuhani, para completar a orquestração. E assim a obra foi concluida. A primeira serenata é dedicada ao amor e a segunda é dedicada à vida. Para o compositor falecido, consagrado como autor mundial das peças, não poderia ter havido maior coincidência, ao imaginar um hino à vida e morrer durante o seu arranjo. E foi esta peça maravilhosa (segundo os críticos) que foi estreada ontem, em França, numa homenagem póstuma e altamente comovente. Também, como previsto, Hilary Hahn foi a solista.
As obras ou relatos póstumos trazem-nos sempre à memória aqueles ou aquelas a quem dizem respeito. Muita gente e até muitos dos nossos amigos desapareceram antes de fazerem ou dizerem coisas que nós achávamos que eles acabariam, um dia, por fazer ou dizer. Talvez de outros não se pudesse esperar o mesmo. Mas de muitos deles ficamos sempre credores de coisas tão belas que nós acharíamos que eles ainda fariam. Einojuhani teve a sua obra concluida e inaugurada, mas nem para todos no mundo, mesmo entre os nossos amigos, houve oportunidades de os honrar com os “póstumos” das suas vidas.
Resta o amor que lhes dedicámos e o amor que nos dedicaram. É a vida!
Deixem-me terminar com uma frase de John Lennon com a qual só há bem pouco tempo tropecei: “Não interessa quem tu amas, onde é que amas, porque é que amas, quando é que amas ou como é que amas, o que interessa é que amas”.
Para que não seja a título póstumo.
É verdade, que a homenagem, nem sempre é feita em vida. Talvez pela falta de espontaneidade, a falta de tempo, a fraqueza de se dar o valor pela obra que fica para sempre, vamos lá saber por que razões…! Talvez, a homenagem a título póstumo, tenha a mesma força de uma simples lápide, anunciando a obra para a eternidade…!
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