SONHO DE VERÃO

Acordou, de repente, em sobressalto, deitado na cevadeira, ouvindo com clareza o resfolegar da água. Olhou para baixo e assustou-se com a visão da carranca, hirta, sisuda, talvez ameaçadora. Mas também bela nas suas pinturas frescas, recentes e tradicionais. Já mais acordado deixou-se resvalar pela cevadeira, agarrando-se, com cuidado, aos cabos de proteção do gurupés. No castelo da proa olhou, com preocupação, para o guincho de içar e largar o ferro de almirantado. O cabo passava pelo escovém e o ferro estava içado. Navegava-se. Olhou para cima e viu a giba, bujarronas e estai enfunados pelo vento. Não viu ninguém. Correu para a popa passando pelo traquete, pelo grande e chegou à mezena, já no castelo de popa. Tudo com vento e a navegar. Para onde? Quem comandava? Lembrou-se do “Navio Fantasma”, de Wagner, mas tremeu e não acreditou. Continuou a circular pelo tombadilho e convés principal mas não viu ninguém. Precisava de perceber o que se passava, porque estava ali, para onde ia ou o levavam. Espreitou pela gaiuta para o convés inferior e não ouviu nada nem viu ninguém. Só havia uma solução: tentar, de mais alto, ver mais longe, mais horizonte. Correu até ao mastro grande e começou a trepar pela enxárcea. Chegou ao nível da primeira gávea e continuou. Estendeu na última verga, até ao lais, e viu-se em cima do mar, em movimento. Foi subitamente atacado de vertigens e não resisitiu. Abriu as mãos e caiu, voou empurrado pelo vento, até sentir o corpo esmagar-se na água. Acordou, suado, no seu quarto de verão relembrando a sua primeira viagem num grande veleiro. Tantos anos passados e tantas sensações tão reais. Levantou-se, vestiu-se desportivamente e foi correr para a praia.

Este texto podia acabar aqui correndo-se o risco de poucos o perceberem. Os termos utilizados parecem ser de outras origens ou ortografias. Mas não. Quem tiver paciência vai encontrar tudo no inefável “google”. Mas o mais fácil é falar com um oficial de Marinha, amigo, que lhe contará, em poucas palavras, tudo o que o rapaz sonhou.

Outra hipótese é não ligar nenhuma e passar para outra. É o que se faz quando não se gosta do que se leu.

Bons sonhos de verão!

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