Faz agora um século que morreu Auguste Rodin. Data assinalada por grande parte da nomenclatura artística e cultural mas que talvez tenha passado despercebida à maioria dos cidadãos, nos quais me incluo. Relacionei a notícia da data, lida já não sei bem onde, com a passagem do filme que julgo se encontra ainda em exibição, mas que não vi. Do que sempre me lembro de Rodin, ao longo dos anos, é a arte da sua escultura, a genialidade de todas as suas obras, os pormenores extraordinários das suas composições, a quase realidade que nos assalta quando as olhamos. Foi um figurativo em todo o seu esplendor, preocupado em dar-nos a verdade das coisas, sem mistificações nem disfarces. Foi, portanto, um polémico no seu tempo, criaram-lhe crises artísticas que sempre ignorou e superou. Viveu e trabalhou em recolhimento, apreciando a natureza que o cercava, invocando-a em cada obra que produzia. Falar de Rodin é falar da sua obra “O Pensador”, a figura maravilhosa de um homem despojado refletindo, pensando quase que dolorosamente, possivelmente, no mundo em que se enquadra. É o autor a pensar, é talvez Rodin a sofrer, é a imagem essencial da vida inteligente, da vida a que estamos obrigados a viver. Pensar, meditar, refletir em nós e nos outros é a única forma de tornar possível o que possamos ambicionar e desejar para o futuro.
Outras obras de Rodin, imensas, fazem parte do património artístico e mundial. São exuberantes as suas “Portas do Paraíso” que podem ser admiradas em Florença, as suas inacabadas “Portas do Inferno” (a sua interpretação do “Inferno de Dante”) feitas por encomenda para um museu que nunca foi construído, merecem uma apreciação detalhada das partes já incluídas no corpo final, em conjunto com as que não chegaram a ser integradas. Sou, de forma incipiente mas apaixonada, apreciador de escultura, de pintura e de outras formas de expressão artística. Se as virmos com tempo e cuidado, a maior parte delas transportam-nos a zonas de pensamento e de interpretação da vida que nos ajudam a entender as maravilhas e as agruras deste nosso mundo.
A obra deste escultor e, em especial, o seu “Pensador” (o nosso tema de hoje), transporta-nos ao âmago da vida, à generosidade do que damos ou não damos, aos conflitos que se originam ou se evitam, às sombrias razões de ignomínia, de deslealdade, desonestidade, falsidade e, digamos sem medo, traição. A ignorância, a incompetência, a sobranceria arrastam o mundo para o pior de si próprio. Nem os “Infernos” nem os “Paraísos” são, para mim, os quadros de ambição das nossas vidas. Só o pensamento lúcido, tranquilo, doloroso por vezes, nos pode alertar para os descaminhos que não desejamos, nem para nós, nem para os outros.
Por isso sempre achei que “O Pensador” de Rodin quereria significar algo mais do que nos é dado pela escultura. Desculpem este devaneio, esta navegação sem latitude nem longitude, mas os cem anos da morte do escultor obrigou-me a relembrar, com esta sua obra, um mundo enorme de incertezas e perplexidades que me têm acompanhado na vida.
Um tema muito bonito. A escultura e a arte de despir uma pedra bruta, descobrindo-se-lhe nela, o talento do seu escultor. Ou ainda a arte de trabalhar o barro, modelando-o, criando beleza da sua arte. Conheço poucas obras de Rodin, além do Pensador. Talvez muitos de nós, o conheçamos apenas por esta figura algo bruta, como se tratasse de apenas um estudo. A verdade, é que também como muitos outros, aprendi a gostar desta peça à primeira vista, pela força que inspira. E a arte tem muito disso…! Também gostei muito do ” devaneio “. Também é isso que vamos sentindo, de semana a semana, de hora a hora, de minuto a minuto, de um mundo que se despe, se delapida, como os escultores fazem com a pedra bruta, mas sem vestígios de arte…!
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