O OLIMPISMO E O DINHEIRO

 

O praticante desportivo mais rico do planeta não é, como poderíamos pensar,  Floyd Mayweather, LeBron James, Leonel Messi, Cristiano Ronaldo ou Roger Federer. Não, nada disso. De acordo com as investigações realizadas por Andy Bull (Guardian) o mais rico é Michael Bambang Hartono, homem com 78 anos de idade vivendo na pequena cidade de Kudus, na Java Central, Indonésia. Hartono é especialista em duas coisas: em fazer enormes fortunas com a venda de cigarros de gengibre (clove cigarettes) e como jogador de bridge. Segundo a Organização Mundial de Saúde cerca de 65% de adultos na Indonésia fumam e, de acordo com a Forbes, um em cada cinco cigarros que eles fumam é produzido pela companhia de Hartono, a Djarum Group. Em 1997, com a queda do tabaco, o Djarum Group investiu o dinheiro do tabaco na compra do maior banco da Indonésia, o BCA, e a partir daí passou a investir em imobiliário, novas tecnologias. Ele e o irmão foram considerados os homens mais ricos da Indonésia nos últimos nove anos, valendo as suas fortunas, em conjunto, mais de três vezes do que a do segundo classificado.

Pois é este homem que se tornou, desde tenra idade, um extraordinário e apaixonado jogador de bridge. Em 2016, depois de alguns anos de persistência, Hartono conseguiu que o Conselho Olímpico da Ásia incluisse o bridge como modalidade de competição nos Jogos Asiáticos de 2016. Ele próprio integrou a equipa da Indonésia e ganhou uma medalha de bronze. Os prémios financeiros que foi recebendo entregou-os à sua Fundação de Bridge.  Durante os Jogos Olímpicos de Inverno de 2012, em Socchi, conseguiu, através da Fedração Internacional de Bridge,  preencher os vazios das tardes, sem competições, com provas experimentais de bridge. Hartono tem grandes e importantes amizades no mundo do bridge, como Warren Buffet e Bill Gates, que muito o respaldam nas suas permanentes tentativas de incluir o  bridge como modalidade olímpica. Como se sabe, o bridge, como outros jogos, não considerados desportos, como o xadrez, as damas e, mais recentemente os e-games, têm estado incluidos numa Federação Internacional com o nome de “Mind Games”. O problema é que a força das verbas em causa nas provas realizadas nestas modalidades tem despertado os discretos interesses do Comité Olímpico Internacional. Os e-Games já ganharam o estatuto de observadores e nada nos diz que as fortunas ligadas ao bridge não venham também a seduzir as “carteiras financeiras” do olimpismo.

Os lobies bilionários destas modalidades continuam a exercer todo o tipo de influências junto dos responsáveis olímpicos e o argumento da diferença entre “desporto” e “jogo” começa a tornar-se mais difuso,  levando também em conta o número de praticantes que os “jogos” já arregimentaram  e as enormes quantidades de dinheiro e patrocínios que o Comité começa a pressentir nas suas finanças.

Sou dos que têm uma determinada leitura da Carta, da Ética e do Espírito Olímpicos e entendo-os de uma forma menos comercializada e mais restritiva. Convivi com essa realidade durante bastantes anos e não me resigno às mudanças que se aproximam à sombra do dinheiro. Os jogos terão, decerto, o seu lugar na sociedade atual. Os seus praticantes e dirigentes têm todo o direito de se organizarem e promoverem a internacionalização das suas modalidades mas, em minha opinião, em contextos diferentes do olimpismo. Acredito que, no mundo atual, essas mudanças se venham a verificar. A minha nostalgia olímpica será, infelizmente, ultrapassada. Basta interpretar as condições de reflexão sobre o tema que o próprio Presidente do Comité Olímpico Internacional já prometeu aos seus interlocutores. Virá por aí muito dinheiro o que não significará, forçosamente, mais distinção e elegância no mundo do olimpismo. É bom  que nos lembremos o que se tem passado, recentemente, com altos dirigentes olímpicos. Corrupção, violação de comportamentos, prisões efetivas de altos responsáveis. Isso, sim, seria um bom ponto de reflexão para a renovação do espírito olímpico. Para não assistirmos, de novo, à vergonha pela qual o Olimpismo tem passado por culpa da ganância e do dinheiro sem controlo.  Estarei antiquado? Talvez, mas preferia ver o Olimpismo, permanentemente, como um exemplo de seriedade, de comedimento e de orgulho nas regras do seu Fundador.

 

2 pensamentos sobre “O OLIMPISMO E O DINHEIRO

  1. Não ! Não está enganado e muito menos antiquado…! Não sei se os assuntos, hoje em dia, estão a ser tratados com demasiada leviandade, ou se a leveza com que se tratam, não é uma propositada forma de corromper costumes e de alterar normas ” à la Carte “, pela modernidade, conforme os interesses dos mais poderosos…!

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