Em tempos em que a tristeza nos invade e as más notícias se propagam vertiginosamente, parece-nos que deixou de haver beleza entre nós e no universo. Diminuimos a nossa capacidade de ver. Olhamos, claro, mas perdemos muitas vezes a capacidade de ver e perceber tudo aquilo para que estamos a olhar. Tenho eu próprio descoberto a quantidade enorme de árvores que rodeiam os percursos que normalmente faço. E há tanto tempo que elas já lá estavam… A beleza do mundo não diminuiu, nós é que talvez tenhamos vir a perder a nossa capacidade de apreciar e amar. As atribulações por que estamos a passar e que, na realidade, nunca se nos pôs passar, inibem-nos de continuar a fazer o que vínhamos fazendo desde sempre. Possivelmente não voltaremos a fazer as mesmas coisas da mesma maneira mas acabaremos por encontrar iguais formas de conviver e de apreciar tudo o que nos rodeia e, sobretudo, de amar o próximo como sempre tínhamos feito. Estamos a conviver com uma vasta gama de juventude que , quer queira quer não, ficará marcada por esta intempérie que a assolou. Já lhe chamam a “Geração Covid”. Uma geração que não tem meios razoáveis para continuar os seus estudos, os que acabam os estudos e não sabem para onde ir, os que não se identificam com esta nova forma de estar, os que só dentro de algum tempo, estabilizada a borrasca, virão a encontrar o seu figurino de vida e o seu local de permanência. E para eles e para nós será sempre útil concentrar-nos no que ainda há de belo no mundo, de tudo o que tem sido belo e na beleza que hoje se cria e que marcará a época que estamos a viver.
Tudo isto me recordou a beleza, onde está a beleza e o que é a beleza. E lembrei-me de Umberto Eco que escreveu, há anos, uma maravilhosa História da Beleza que vale a pena apreciar e rever. Umberto Eco foi escritor, filósofo, linguista e bibliófilo de fama internacional. Nasceu em Alexandria, Itália, em 1932 e morreu em Milão em 2016. Dos muitos livros que escreveu alguns foram adaptados ao cinema, de entre os quais talvez “O Nome da Rosa” seja o que mais rapidamente nos vem à memória. Mas da sua famosa “História da Beleza” respigo algumas das suas notas preambulares: “Tudo o que escolhi da vasta antologia de textos, de Pitágoras aos nossos dias, serve para reconstituir as várias ideias de Beleza que se manifestaram e foram objeto de discussão desde a Grécia Antiga até hoje. A Beleza encontra-se na natureza, nas flores, nos animais, no corpo humano, nos astros, nas relações matemáticas, na luz, nas pedras preciosas, nas peças de vestuário, em Deus e no Diabo. Não só em épocas diferentes mas, por vezes, no interior de uma mesma cultura, diversos conceitos de Beleza entraram em conflito.”
Esta pequena referência serve apenas para lembrar que, apesar de tudo o que se possa viver ao longo da vida, deveremos ser capazes de apreciar a Beleza e lutar por ela. Para que, dessa forma, possamos enfrentar melhor as terríveis obsessões do quotidiano. Se quiserem e tiverem oportunidade de consultar Umberto Eco talvez compense a solidão a que, de momento, estamos votados. Sem esquecer todos aqueles, que são muitos, que vivem terríveis momentos de desespero e angústia. Contemplar a beleza de pouco lhes servirá mas talvez atenue um pouco o sofrimento por que, sem culpa própria, estão a passar.
Não são poucas, as vezes em que acordo na escuridão da noite e fico a ver passar pela mente, os séculos de vida que já passei. A actualidade deste texto, mostra bem as dúvidas que o futuro nos está a preocupar…! Seremos diferentes ? Pensaremos diferente ? Viveremos diferente ? Estou certo que a dinâmica do ser humano, irá ultrapassar tudo o que está acontecendo..! Vamos continuar a sentarmo-nos nas esplanadas. A ir ao cinema numa noite quente de verão ou mesmo em dias de chuva como sempre o fizemos. Gozar as delícias da praia ou de um passeio mais longínquo. Talvez as atenções, como diz no texto, se voltem mais para apreciar o bom que sempre tivemos à mão e nos estava a fugir…!
GostarLiked by 1 person