WIMBLEDON versus PUTIN

Como se sabe, Wimbledon é um dos torneios de ténis mais famosos do mundo. Será talvez O torneio de ténis. Muitos outros já são famosos há muito (Roland Garros, em Paris, por exemplo) e uma multidão deles tem vindo a ganhar fama ao longo dos anos. É costume dizer que “não há nenhum dia em que não se realize, em qualquer parte do mundo, um torneio de ténis”. É uma modalidade aliciante com milhões de interessados em toda a parte. São os jogadores, os treinadores, as equipas técnicas, as associações e federações em todos os países e, sobretudo, os espectadores. Presenciais ou televisivos. Há muitos anos atrás o ténis era uma modalidade de elite. Deixou de o ser há muito tempo. Há escolas em todo o mundo e a elas acorrem crianças de todas as classes sociais que se transformam, muitas delas, em excelentes profissionais.

Vivi de perto, durante bastantes anos, os meandros da modalidade. Como praticante, medíocre, mas como dirigente de clube, de associação e federação julgo que desempenhei satisfatoriamente “as missões a que me candidatei e me foram confiadas”. Falo hoje, portanto, de um tema que conheço razoavelmente bem e que continuo a acompanhar com o interesse de quem nunca se consegue libertar de uma paixão bem vivida.

Falo hoje do próximo Torneio de Wimbledon que se iniciará a 27 de junho e que manterá intactas as suas tradições, preservadas desde a sua criação pelo All England Club em Londres. Campos de relva e equipamentos completamente brancos usados pelos tenistas são “marcas de água” que o torneio sempre tem mantido. Qualquer jogador profissional ambiciona poder jogar em Wimbledon. Será sempre um ponto alto da sua carreira. Para isso precisa, no entanto, de ter a classificação necessária no “ranking” internacional dos jogadores para poder aspirar ao torneio. É por mérito próprio individual, e não outro, que se atinge esse objetivo.

Ora é aqui que surge o grande problema deste ano do torneio. A política em confronto com o desporto. Estes confrontos não são inéditos mas as Federações internacionais sempre pugnaram por se distanciarem das intervenções políticas, nacionais ou internacionais. O Ministro dos Desportos britânico, Nigel Huddleston, depois de dois meses de deliberações e de conselhos jurídicos, decidiu excluir atletas russos e bielorussos da edição deste ano do Torneio de Wimbledon. Explicou que entende que o Presidente Putin não pode utilizar o Desporto para legitimar a invasão bárbara da Ucrânia pela Rússia. O governo chegou inicialmente a lançar a ideia de que os atletas daqueles países deveriam assinar um documento condenando Vladimir Putin. A ideia foi, de imediato, rejeitada pela organização do Torneio considerando-se as implicações perigosas que a iniciativa poderia criar para os jogadores e suas famílias. No entanto, o Presidente do All England Club disse num comunicado: “Admitimos que para todos os atletas descriminados esta medida seja triste e que sofram pelos actos dos principais dirigentes russos. Se a situação se alterar até ao mês de junho procederemos a uma revisão proporcionada da nossa posição”. Por esta deliberação são abrangidos os 4 principais jogadores russos, incluindo o nº2 da escala mundial, Daniil Medvedev. A Rússia conta ainda com 5 jogadoras entre as primeiras 40 do ranking mundial e a Bielorússia duas qualificadas em 4º e 19º ligares mundiais.

Esta decisão tem sido alvo de muitas críticas e é, na realidade, muito discutível. Por outras e diversas razões desde há anos que a Rússia não pode fazer-se representar por seleções do país mas apenas por equipas constituidas por atletas russos. Nem sequer é este o caso de Wimbledon: os atletas presentes, sê-lo-ão em termos individuais e não escolhidos ou selecionados por entidades russas. A terrível realidade da Ucrânia leva, no entanto, alguns responsáveis a revelarem o que, muito legitimamente, lhes vai na alma. Mas há que levar em conta, com muito cuidado, as circunstâncias reais que se lhes deparam. A responsável pelo próximo torneio de Roland Garros, Amélie Ouéda-Castéra, diretora-geral da Federação Francesa resumiu o assunto da seguinte maneira: “Vamos impor a estrita neutralidade aos jogadores russos e bielorussos… Seguimos o princípio dos Ministérios dos Desportos da União Europeia: só se deve banir um atleta individual se ele for selecionado pelo seu país. É aí que nos situamos.” Também a ATP (Associação dos Tenistas Profissionais) declarou: “A decisão unilateral de Winbledom é injusta e poderia criar um perigoso precedente para o desporto. A descriminação baseada na nacionalidade constitui igualmente uma violação do nosso acordo com Wimbledon que estipula que a entrada dos jogadores é baseada unicamente nas classificações ATP.” O próprio Times escreveu nas suas páginas: “Wimbledon envolveu-se numa trajetória de colisão potencial com o restante mundo do ténis”.

Fica aqui um exemplo do que, à primeira vista, parece lógico mas que, na realidade, se pode transformar numa monstruosidade pessoal. Pena é que a guerra tenha começado, sem que tenhamos dúvidas de quem são o agressor e o agredido. E pena é também que o seu inevitável prolongamento não traga a paz a todo o mundo, como seria justo esperar. Só a diplomacia pode resolver a guerra. É apanágio do Desporto ser um criador de relações e de se opor, sempre, aos conflitos. Esperemos…

Um pensamento sobre “WIMBLEDON versus PUTIN

  1. O desporto, uma ocupação dos tempos livres que nada tem a haver com a política. Mas será correcto, tudo o que se ouve no meio de tantas paixões e ódios, que nada favorece o salutar entendimento entre os povos e as suas experiências e ensinamentos ? Quantas amizades se formaram com o livre intercâmbio de equipas e quantos momentos de boa harmonia se realizaram através do desporto, sabendo-se que há sempre a pequena vaidade escondida de evidenciar o seu melhor, ainda que em certas circunstâncias, as inter-ajudas se façam sentir em momentos de perigo ou necessidade, tantas vezes assistida nas Competições Náuticas, Rallys, e principalmente no famoso Paris-Dakar. Não quero esquecer aquele famoso programa de televisão que aproximou toda a Europa : Jogos sem Fronteiras, era assim o seu nome. E tantas barreiras, essa sublime competição fez saltar ?
    Mas, o Ténis, uma modalidade que desde garoto me despertou o gosto pelo desporto, foi a minha maior paixão que nunca consegui concretizar verdadeiramente. A falta de escola e a pouca atenção que se dava àquele desporto considerado de Elite. E aos poucos, lá nos íamos entendendo, nos Courts do Campo Grande, sempre tão mal tratados. Uma ou outra fugida da praia do Estoril, até aos Courts do Pálace Hotel, enfrentando já um outro nível que nos deixava arrasados, para não dizer, um pouco envergonhados.
    Histórias que vêm de longe…!
    Ainda muito novo, assisti muitas vezes nas Termas da Curía, àquele vai-vem de batidas seguras, e o som característico da pancada firme na bola. O gesto suave e calculado do batimento da raquete, provocando o spin na bola, atirando-a para o campo contrário. Um som quase seco e alongado, que se misturava com os gemidos de esforço, numa luta onde em simultâneo se misturavam sorrisos de surpresa e palavras que eu não entendia.
    Vivíamos tempos de guerra, cujas notícias nos iam escurecendo a alegria e as conversas que ouvíamos, mal entendidas por vezes, com os medos que nos faziam pensar, ainda que muito jovens.
    A amizade começava também ali, naqueles Courts de Ténis, com idades diferentes, sem experiência alguma, onde se falavam outras línguas, que na minha mais insignificante ignorância, podia imaginar os dramas que os acompanharam até ali. Refugiados da Guerra ! Era o nome, que entre nós, substituíam os seus nomes próprios ou os seus apelidos ! Fiquei a conhecê-los(as) por Elga, Kurt ou Huber e tantos outros nomes que os tempos me fizeram esquecer…! Eles e elas, também tinham nomes próprios que nos agradava pronunciar, entre sorrisos amigos. Amizades que tinham o gosto comum, de viver e saborear a paz que o desporto tão bem proporciona. Eu era um garoto. Eles, um pouco mais velhos, já eram adultos. Precocemente adultos…!

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