Segundo a reconhecida opinião de um segundo violino da orquestra de Paris, Nikola Nikolov, “o primeiro violino solo de uma orquestra, pela sua bagagem, pela sua maneira de tocar, pelas suas escolhas de toque com o arco, pode realmente mudar, só por ele, o som e o estilo de uma orquestra “.
Levando em conta o peso desta declaração compreende-se a responsabilidade dos concursos e das escolhas que a Orquestra de Paris e a Filarmónica da Rádio France estão a desenvolver no sentido de recrutarem, cada uma delas, uma dessas quase raras figuras. Chamam-lhe muitas vezes, a essa pedra rara, o segredo do Graal. Nos próximos dias 11 e 12 de Maio, entre 8 a 10 candidatos devem apresentar-se às provas finais do concurso organizado pela orquestra de Paris para encontrar esse primeiro violino.
Estamos habituados a assistir nos concertos à entrada ritualizada do primeiro violino. É o último a entrar e cumprimenta o maestro. É ele que se levanta e dá os lamirés de acordes para a afinação da orquestra. Para isso tem que demonstrar uma autoridade natural, um carisma decorrente da sua qualidade artística, da sua “indiscutibilidade”. Mas sem perder os dotes humanos naturais perante os seus companheiros. Este bom super-solista deve ser capaz de acompanhar e de traduzir as ideias e os detalhes do chefe de orquestra, de encontrar rapidamente as soluções que permitam a resposta em tempo da orquestra. Mas também tem que detetar a mais pequena tensão da harmonia para a desfazer como se estivesse a fazer diplomacia musical.
Nos dias 15 e 16 também deste mês a orquestra de Paris põe em marcha o seu próprio concurso para recrutar um novo primeiro violino. Neste caso terão que ser encontrados três desses “mágicos“ pela necessidade imposta pelas peças musicais programadas para as próximas temporadas.
O que se passa com os violinistas é o que se passa também com qualquer outro instrumentista de orquestra, com maior ou menor visibilidade ou responsabilidade. Mas todos estes detalhes nos levam a pensar não só nas dificuldades de constituir uma boa orquestra mas, também, os custos envolvidos. Os grandes concertos e as grandes orquestras não se pagam por si próprias. Há que respeitar os preços dos bilhetes, a seguir vêm os patrocinadores mas, praticamente sempre, estes custos monumentais têm que ser encarados pelos responsáveis políticos como investimentos fundamentais para a cultura e visibilidade dos seus países. Só quando se atingem níveis de desempenho de enorme qualidade é que os meios de comunicação, em especial as televisões, se podem interessar pelas suas transmissões a nível mundial.
É evidente que este texto não é feito por conhecedor nem sequer pretende divulgar factos que os “conhecedores”, esses sim, conhecem de cor e salteado. Pena é, no entanto, que esse conhecimento não se traduza numa maior abertura nos nossos mercados musicais. Há exemplos em Portugal de esplêndidas orquestras que, no entanto, não são transmitidas com frequência pelas televisões. Dizem que não têm audiência. Talvez. Mas se a curiosidade infantil fosse despertada e treinada para esse mundo maravilhoso estou certo que muitos primeiros violinos apareceriam nos concursos internacionais. Como, aliás, já surgem em muitas orquestras por esse mundo fora.
Mas era bom que nos lembrássemos que a cultura e a arte são duas boas razões pelas quais se fazem guerras (foi o Churchill que disse…)