DIA MUNDIAL DO LIVRO

Hoje há milhares de artigos sobre livros por ser o Dia Mundial do Livro. Este pequeno texto serve apenas para relembrar a data e fazer um pouco de apologia do livro em papel, com cheiro a tipografia. Uma ideia que vai contra o que os progressos do mundo nos vai apresentando. Os grandes ideólogos do mundo digital defendem a facilidade de escolha de um livro no seu computador e lê-lo, sem sair de casa e a qualquer hora e sítio. É verdade, têm razão. Raramente o faço mas já experimentei. Não sou obstáculo mas não me habituei.

Para os da minha geração (já chegados ao “prazo de validade”) os livros fazem parte da nossa vida, do nosso passado, da nossa história (e cada um tem a sua). Lembro-me bem, em criança, de ler livros e banda desenhada como diversão e como ocupação de tempos vazios . Pouco mais havia para fazer além do desporto, claro, que nos dava um especial palpitar de vida, afastados dos vícios da competição que hoje proliferam e nos desgostam.

Mas falemos de livros. Tomei consciência da responsabilidade do livro quando no liceu (chamava-se assim) um professor de Português nos deu um TPC que deveria ser uma redação sobre o que é um livro. Fomos todos para casa com a noção de que não haveria nada de especial para dizer. No dia de apresentação dos trabalhos alguns até faltaram. Eu lá fui com um texto que me tinha tirado horas de sono. Os que apresentaram qualquer coisa foram elogiados pelo professor. Houve pequenas compensações. A mim coube-me um livrinho que ainda hoje conservo: “Florilégio do Cancioneiro de Resende”. Um livro destes desmoraliza qualquer jovem infante e só passados alguns anos me apercebi do interesse da obra. Já o folheei diversas vezes.

Vou fugir do trivial e recorrer a um homem que marcou a História do século passado e que não deixou traços de simpatia: Estaline. O ditador soviético era um leitor insaciável e reuniu uma biblioteca de milhares de livros. Não os colecionava mas lia-os quase com obsessão e anotava-os durante a leitura. Tal como Paul Lafargue disse a respeito de Marx, para Estaline os livros eram ferramentas da mente, não artigos de luxo. Tudo isto tem vindo a ser estudado por especialistas universitários que ficaram maravilhados com o ecletismo das suas leituras, incluindo-se as obras mais famosas do mundo ocidental. Todos os argumentos das obras que leu sempre lhe deram pretextos para lhe sancionar o assassínio em massa na sua implacável luta de classes em defesa da revolução.

Como conhecedor de toda a literatura Estaline perguntou uma vez a um grupo de escritores russos o que é que achavam do seguinte enredo: “Ela é casada, tem um filho, mas apaixona-se por outro homem. O amante não a compreende e ela suicida-se.” Banal, foi a resposta dos escritores. “Com este enredo banal, replicou Estaline, Tolstói escreveu Anna Karenina.”

Nos muitos prémios atribuídos com o seu nome, o premiado sempre saía de uma lista que um comitê lhe preparava. Lista que incluía nomes como o dramaturgo alemão Bertolt Brecht, o romancista americano Howard Fast e o jornalista soviético Ilya Ehrenburg. Ao receber a lista Estaline perguntou: “E porque é que o Neruda não está entre eles?” Pablo Neruda , que venceu o Prémio Nobel da Literatura em 1971, tinha anteriormente escrito uma ode de louvor a Estaline que ficou para a História.

Saiamos deste exemplo e fixemo-nos apenas na importância do livro. Seja ele digital ou em papel. Podemos ler textos com que concordamos e muitos outros de que discordamos. Não faz mal. É para isso que serve a leitura. Para que as novas gerações não se cinjam aos Twitter, Instagram, Skype e quejandos que os impedirão, dentro de pouco tempo, de escrever uma carta ou mesmo um e-mail um pouco mais elaborados.

Dia Mundial do Livro. Leiam!

2 pensamentos sobre “DIA MUNDIAL DO LIVRO

  1. Lá em casa, muitos dos livros passavam de mão, quase que hierarquicamente. De meu pai ou de minha mãe para os meus irmãos, chegando às minhas mãos, com certos atrasos. O eterno problema dos mais novos…! Os comentários aguçavam-me a curiosidade, aumentando as minhas súplicas para leituras mais rápidas. Um hábito que me levava a furar o sistema de leituras, ocasionando pequenos conflitos entre irmãos. Com a mudança de idade, as colecções de Emilio Salgari, com Sandokan, tomavam o lugar dos romances mais sérios que começava a por de lado, até que noutra ocasião, alternava com as aventuras de Jack London, supostamente um bêbedo e arruaceiro. Mark Twain e Ernst Hemingway, passaram a deliciar-me com a leitura de novas aventuras, tão apropriadas ao meu espírito teenager, até que as aquisições começaram a inclinar-se para outros escritores da época, de cujos romances também se produziram grandes filmes. John Steinbeck e William Faulkner passaram a ser os meus companheiros de tempos perdidos, sentado algures em qualquer canto da casa…!

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  2. Os livros sempre foram para mim uma companhia fundamental. Nunca deixei de ler um pouco todos os dias. Mesmo, ou sobretudo, no mato durante a guerra colonial.,
    Também leio muitas coisas no computador, mas nunca aquilo que se costuma chamar obras literárias. Não tem graça e não dá jeito

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