Passou-se no ano de 1950. Por decisão familiar, acompanhei o meu pai, numa viagem ao Brasil. Após a obtenção de toda a documentação necessária, embarcámos no navio Serpa Pinto, rumo ao Rio e Janeiro. Era longo o percurso, que o deslumbramento incontido de uma primeira viagem, fazia atenuar a saudade da casa que iria deixar por tempos indeterminados. Era um projecto de família, dando continuidade a negócios em novas terras. O Brasil, estava dando um grande salto de progresso industrial. O Cruzeiro, valorizava-se, talvez inflaccionado, em contra-ciclo com o Escudo. Era o resultado de um Panamericanismo, resultante de um pos guerra, liderado pelos Estados Unidos. A Europa, por sua vez, tentava sair da miséria em que tinha caído, com a ajuda do Plano Marshal. Era este, o panorama que alimentava as minhas ansiedades naquela viagem longa. Os 11 Nós de velocidade média, daquele paquete, lançado ao mar em 1912, contemporâneo do Titanic, continuava a sua sonolenta rota, sem nunca alterar os seus tradicionais 15 dias até ao Rio. Todo esse tempo, deu para conhecermos melhor quase todas as famílias que viajavam connosco, ganhando novas amizades. Conversas e projectos futuros de encontros quando chegássemos a terra, prometidos durante os passeios pelos Decks, nos bailes após o jantar e invariavelmente os Flirts, tão daquela época, em conversas em volta de um café, no Salão Nobre. Comecei a compreender, quais os locais favoritos, onde nos iríamos encontrar na praia…! Copacabana, era a que estava mais em voga, e estava mais à mão para todo o grupo. Apontávamos os números de telefone uns dos outros. As amizades não podiam acabar por ali. Eu dava o de casa de meus tios e primas, na Praia de Botafogo, onde iria morar provisóriamente. Era um mundo novo que se abria. E as conversas, inclinavam-se por vezes para a política, coisa que me surpreendia pelo desuso obrigatório em que sempre tinha vivido. O à-vontade com que se falava, fazia crescera em mim, o gosto de discutir aquilo que mais me parecia colidir com a dignidade e a personalidade das pessoas. Aquela espontaneidade, tinha a ver com a liberdade de expressão que se vivia no Brasil. A democracia, era já tudo isso ! Com Dutra ou Getúlio, todo aquele grande país, crescia…! À chegada ao Rio, durante o desembarque, já na escada de portaló, uma amiga, virando-se para trás, gritou-me avisando-me que desde que pusesse os pés em terra, nunca seria preso por discordar publicamente, do Presidente da República. Sorri-lhe e com um encolher de ombros, murmurei sobre o pouco que isso serviria, sendo apenas uma gota de água…! Só mais tarde, me apercebi, que os rios, são constituídos por muitas gotas de água a correr em liberdade. Apenas, nunca consegui saber, para que mar…!
Não me surpreendeu o que escreveste. Sei que foi a tua primeira grande aventura. Bravo! Continua…
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Se isto se tratasse de uma corrida de F1, este novo autor ganharia o prémio de ser o primeiro a sair das “boxes”!
Inicia a sua intervenção com o agradável relato de um episódio da sua vida aos 16 anos.
Muitos da nossa geração reconhecerão as balizas e as dúvidas daqueles tempos. Parabéns.
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