Foi ontem, dia 21 de Fevereiro, o Dia Mundial da Língua Materna. Pensei ou desejei escrever sobre esse dia. Mas não escrevi. Amadureci. O tema, o poema ou a forma. E apesar de, em todo o mundo, os mais ilustres escreverem sobre as suas línguas maternas, não desisti e pus-me a recordar como e se tenho respeitado a minha língua. Nem sempre, reconheço, mas tenho tentado. Nunca conseguiria dizer ou inventar, como fez Fernando Pessoa, a mais célebre de todas as frases: “Minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Mas ele disse-a e, desde sempre, a tenho ouvido como a maior apologia da nossa terra, entrelaçada com a língua, que é nossa, por nós adaptada ao longo dos séculos e transportada para onde calhasse que fôssemos. E não se poderá dizer que fomos inaptos nessa matéria. Já me arrepiei, em recônditos cantos do mundo ou em parcerias com amigos de outras línguas, ao ouvir falar ou cantar em português, na minha língua, e isso deu-me, nesses momentos, não tenho dúvida, um grande orgulho interior. Terei sentido, nessas alturas, os fervores da “Minha Pátria”? Não sei… talvez. Mas o que sei é que nunca me incomodei com as progressivas alterações, adaptações, atualizações que a minha língua foi sentindo ao longo dos anos. Já passei por algumas dessas fases e, com facilidade, me adaptei. Principalmente, julgo, porque a iniciativa era nossa e era para nós, donos da língua, que essas alterações eram elaboradas. A mais recente alteração (que me perdoe o cientista da Língua, Malaca Casteleiro que, infelizmente, nem sequer já pode exercer o contraditório) trouxe-me alguma infelicidade. Não por ser uma alteração, mas por ser uma tentativa de incorporar ou importar, como queiram, jeitos ou detalhes de língua e escrita que não são os nossos. Tantos dos outros países que têm como língua oficial o “português” nunca se incomodaram em o adaptar ou em violá-lo de acordo com os seus costumes ou os seus linguajares. Nada de mal, mas a raiz é o português. O “bué” diz-se em países onde se fala português mas não em todos, onde esse termo é substituido por palavras de igual significado e também de imensa originalidade. Teremos nós, aqui, que integrar esses termos no nosso léxico? O acordo diz que sim mas muita gente acha que não. Realmente não vejo inconveniente em usar esse novos termos em linguagem corrente, mas não preciso que eles integrem o nosso dicionário como, aliás, tantos outros, com diferentes origens, que nem sequer tentamos traduzir: “Ciao, au revoir, yes (agora com a modernidade do yá), para não falar dos iphones, ipads ou tablets e tantos outros que já nos inundaram”. E o tal Acordo tão propagado e legislado acabou por não passar, ainda, de letra morta para outros países a que se destinava. Se calhar também pensam nas línguas deles no “Dia Mundial da Língua Materna”. E por isso andam por aí, nos meios de comunicação, imensos abaixo-assinados para que se revogue o tal Acordo. Personalidades, com visibilidade mediática, dizem, nos finais dos seus textos, que continuam a escrever “à moda antiga”. Não será de estudar bem, de novo, esta situação? Mais difícil agora, que nos deixou o proponente base do diploma. Por isso vamos continuar a fazer as atas das reuniões ao mesmo tempo que atamos os atacadores dos sapatos…
Deixemo-nos de lamentações. Seria “Lesa Pátria”, de acordo com a definição de Pessoa, se não recordássemos, hoje, pequenas frases de alguns dos nossos grandes escritores.
“Mar /. Metade da minha alma é feita de maresia”. ou
“Quando eu morrer voltarei para buscar / Os instantes que não vivi junto do mar”
(Sophia de Mello Breyner)
ou
“Algum dia o poema será a buganvília… /. Quando nada restar, nem o pó de um sorriso que é o mais leve de tudo que se pode supor, / Será esse o momento de o poema ser flor, mas já não é preciso.
(António Gedeão)