Sabemos da História que Salomão, filho de David, foi o Grande Juiz e Rei que governou Israel em tempos imemoriais. Foi considerado, pelo seu Deus, o mais sábio de todos os Homens. Mas, por ter desobedecido aos ditames de Deus foi abandonado por este para o punir da cobiça e de outas atrações fatais. No Antigo Testamento fala-se do esplendor do trono de Salomão. Tratava-se de uma enorme construção completamente coberta de ouro e pedras preciosas, com seis degraus que conduziam ao assento, todos os degraus ornados com leões, águias, leopardos e falcões em representação das forças do universo e da natureza. Em cada degrau havia também um arauto cuja função era lembrar a Salomão a Lei dos Reis. Parece que quando alcançava o primeiro degrau lhe era dito: … o rei não multiplicará mulheres para si…
Relembrado este detalhe do Antigo Testamento apetece-nos compará-lo com o que a ética, os costumes e a boa educação vieram a impor em tronos, cadeirões ou assentos mais modestos utilizados ao longo dos tempos. E, sobretudo, à forma cortês como os anfitriões ofereciam outros assentos aos que, amigavelmente, os visitavam. Lembro-me, eu próprio, quando em desempenho de funções institucionais privadas, ter sido recebido por um Presidente da República do nosso país e de por ele ter sido interrogado se me sentia confortável no sofá que me era destinado. Claro que sim, respondi pressuroso. E se aceitaria um café, o máximo que as exigências dos tempos lhe permitiriam. Aceitei com a condição de ser acompanhado pelo próprio Presidente. Assim foi e começámos a conversa. Apenas um convite em nome da instituição que representava, convite que foi delicadamente aceite.
Tudo isto vem a propósito dos “carroceiros” (peço desculpa aos carroceiros) que, por imperdoáveis deslizes diplomáticos, empurraram a Presidente da Comissão Europeia para um sofá de través, depois de alguns esgares de arrepiante incivilidade da parte do Presidente do Conselho Europeu que a acompanhava. Tudo isto se passou na visita, amigável, que os dois, em nome da Europa, fizeram ao sultão da Turquia. A este ter-lhe-á soado nos ouvidos o antigo aviso feito ao israelita Salomão: “o rei não multiplicará mulheres para si…” , sem sequer, lhe ocorrer a amabilidade de oferecer um café (não aprecio o café turco por ter muito depósito em chávena…). A própria Van der Layen, ao princípio hesitante na dança das cadeiras, acabou por se sujeitar a uma péssima preparação diplomática do encontro o que, em tempos mais severos, teria levado ao imediato desaparecimento do embaixador que, por parte da Europa, terá preparado o evento. A falta do café terá sido compensada com uma lauta almoçarada turca mas o amargo de boca de Van der Layen não se terá dissipado com os Kompensans que deve ter pedido e tomado.
Mas o mais grave de toda esta dança de cadeiras, a que já se chamou de “sofagate”, foi o desprestígio a que os dois altos representantes da União Europeia faram sujeitos. Eles, pessoalmente, e a União em geral pela forma deliberada e acintosa como o sultão “carroceiro” conduziu o encontro. A Turquia faz falta à Europa mas Erdogan tenta demonstrar que o seu poder regional é enorme e que uma futura aliança, a existir, terá que passar por gigantescas contrapartidas que, em grande parte, desiquilibram a já tão débil harmonia e estabilidade europeias.
O “Trono de Salomão” (embora Rei imortal dos seus viscerais inimigos israelitas) continua, nos tempos mais próximos, a ser o livro de cabeceira do sultão Erdogan. Basta-lhe ler, todas as noites, umas linhas da Lei dos Reis…
A Turquia faz falte à Europa, mas Erdogan não faz falta nenhuma à Europa ou à Turquia
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