Nos meios escritos de comunicação diária a que vamos dando atenção surgiram no mesmo dia, por coincidência, três notícias que, embora de âmbitos diferentes , julgo merecerem um pouco da nossa atenção por aquilo que transmitem da vida portuguesa. Um caso na Área do Desporto, outro na Área Artística e Teatral e o terceiro que aborda o panorama da nossa literatura e, em especial, da poesia.
Comecemos pelo do Desporto. A Equipa Olímpica foi apresentar cumprimentos de despedida ao Presidente da República, antes da sua deslocação para Tóquio onde irá competir com quase todos os países do mundo em 17 modalidades. Estas modalidades reunem 92 atletas, uma das maiores delegações de sempre, com 35% de atletas femininas. À partida poderia parecer uma cerimónia que se repete de 4 em 4 anos, merecendo do público o entusiasmo habitual. Mas não. Desta vez merecem uma chamada ainda mais à parte. Ser atleta olímpico é o maior desejo de qualquer atleta de alta competição. Mas são proporcionalmente poucos os que conseguem esse propósito. É gente de muito trabalho, perseverança, dedicação sem limites às modalidades a que se dedicam. Fui Chefe de Missão aos Jogos de Sydney 2000 e convivi com tudo o que uma delegação desta natureza exige. Convivi com os atletas, com aqueles a quem as coisas correram bem e os outros a quem as coisa não terão corrido tão bem. Mas não importa. Nestas alturas são todos iguais. O seu título de “Olímpico” acompanhá-los-á sempre, por toda a vida. Esta delegação que agora está de partida é a que se preparou para os Jogos de 2020 mas que, devido aos incidentes da pandemia, só este ano se realizam. E isso teve uma importância fundamental na organização das vidas, nos planeamentos de treinos, nas consolidações das datas e provas de apuramento. Conheço ainda alguns dos componentes da Missão, em especial o atual Chefe de Missão, Marco Alves, com quem trabalhei e de quem sou amigo. Desejo-lhe as maiores felicidades para os trabalhos em que tem estado envolvido e todos os que por aí ainda virão. Merece-o pela sua competência. Por todo o mundo, muitos setores da vida foram muito afetados por este adiamento forçado. Só como exemplo, conheço uma Mestrada de uma Universidade Inglesa que, durante os últimos cerca de 2 anos preparou a sua tese de doutoramento em “Gestão de Grandes Eventos” na preparação, organização e quantificação financeira dos Jogos de Tóquio 2020. Só recentemente a Faculdade decidiu alterar o tema da tese, levando em conta as tremendas dificuldades de deslocação e de circulação nos recintos de Tóquio. Já está a trabalhar no outro tema (Jogos da Commonwealth) mas o contratempo não foi de somenos. Isto passou-se com toda a delegação olímpica. Disse bem o Presidente do COP na sua mensagem de despedida: “Trata-se de uma missão sui generis, pois ocorre num ano após a sua previsão inicial e num contexto de restrições, atendendo à pandemia que ainda se vive no Japão. E num contexto social onde a maioria do povo japonês gostaria que os Jogos fossem novamente adiados ou não se realizassem. Partimos com exata noção da severidade da situação que vamos encontrar”. Mas a verdade é que os nossos atletas, como os dos outros países, já partem vencedores e regressarão vencedores. Cá os esperaremos para os celebrar.
Falemos agora da Área Artística e Teatral. O Diretor do nosso Teatro Nacional D. Maria II e Prémio Pessoa, Tiago Rodrigues, foi designado, por escolha e nomeado pela Ministra da Cultura de França, Roselyne Bachelot-Narquin, para dirigir o Festival d’Avignon, o maior centro teatral do mundo, onde sempre estão presentes os maiores apreciadores e críticos teatrais. Não é por acaso que Tiago Fernandes é designado para o cargo. Há anos que o seu trabalho no D. Maria chamou a atenção para artistas, escolas de artistas, sábios do teatro. Há muito que o mundo percebeu que algo de extraordinário se passava em Lisboa, no Teatro D. Maria. Foi esse o critério da escolha: a competência. Este ano a peça inaugural do Festival d’Avignon é uma criação encenada por Tiago Fernandes: “O Cerejal”, de Anton Tchekhov, que terá lugar na estreia da Cour des Palais des Papes, após as obras a que foi sujeito nos últimos anos. Haverá mais 10 récitas desta peça até 17 de Julho com as sessões já todas esgotadas. A partir de 2022, Tiago Fernandes assumirá a missão de Diretor do Festival. Será que podemos ficar indiferentes ao sucesso deste nosso compatriota? Acho que não.
O terceiro é o tema da literatura, em especial da poesia. Baseio-me num excelente artigo de Luis Castro Mendes, diplomata, escritor e ex-Ministro da Cultura, publicado no Diário de Notícias. Diz ele: “Ana Luisa Amaral ganhou um importante prémio literário, de âmbito ibero-americano, e a reação dos media foi, de início, nenhuma. Ao ser apontada a gafe acabou por aparecer uma entrevista no “Público” (mais vale tarde do que nunca). Este caso confronta-nos com a quase irrelevância da poesia no atual “campo literário” e a sua paulatina desaparição do espaço público. Eça de Queirós nos “Maias“ descreve o esforço falhado do jornalista Melchior para redigir uma notícia crítica sobre um livro de poesia. João da Ega diz-lhe, então, afavelmente, que o jornalista só tinha de noticiar que o livro saíra, onde se vendia e quanto custava. E deixasse às revistas críticas a apreciação das obras literárias. Noticiar um livro deixou de ser novidade literária. Se sair mais uma tradução de Moby Dick, terá direito a mais páginas nos jornais do que qualquer nova obra de autor português. As editoras já perceberam que a literatura não vende. Títulos há muitos mas a qualidade é enganosa. A cotação da literatura anda por níveis que envergonhariam até os “lixos” dos ratings financeiros. Mas a sobrevivência de um trabalho sobre as palavras e a linguagem só desaparecerá quando deixar de haver palavras e deixar de haver linguagem. Porque só a extinção da espécie humana poderá definitivamente remeter a poesia ao silêncio.
Tem razão Luis Castro Mendes. Por favor ensine-se a ler, leia-se e, já agora, também poesia. Verão que vale a pena. Se os jovens aprenderem, gostam e se gostarem lêem.
Em geral, os meios de comunicação social gostam de notíciar escândalos e coisas más. Coisas boas não lhes parecem interessantes.
Mas, no Jornal de Letras de que sou assinante, a poesia está sempre presente. Bem como as restantes actividades culturais e artísticas.
Classificar-se para os Jogos Olímpicos hoje em dia não e fácil. Não basta “ter jeito” para a modalidade, é necessário, como dizes, muito esforço, muita vontade e abdicação de muitas coisas agradáveis que se pode fazer na vida.
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