CONCERTO CORAL-SINFÓNICO

Realizou-se ontem, dia 13 de novembro, um concerto no Teatro Nacional de S. Carlos, com a designação específica de Concerto Coral-Sinfónico (Concerto de Homenagem a Cantores Portugueses).

Envolveu o Coro do Teatro Nacional de S. Carlos, a Orquestra Sinfónica Portuguesa e seis dos melhores cantores líricos atuais. A orquestra foi dirigida pelo Maestro convidado Antonio Pirolli, italiano e com larga experiência e reconhecimento mundiais. O Coro do Teatro teve a dirigi-lo o seu maestro titular Giampaolo Vessella que desempenha o cargo desde Janeiro de 2021.

Para além do espetáculo programado esteve também incluida uma homenagem pública a cantores líricos portugueses que, no último século, tenham pisado o palco do S. Carlos. Tudo por iniciativa da Diretora Artística do Teatro Nacional de S. Carlos, Elisabete Matos.

Um espetáculo, em princípio, a não perder para os apreciadores desta modalidade musical. Estive presente e verifiquei algumas coisas interessantes: primeiro, a sala não estava cheia, muito longe disso; segundo, olhando-se para a generalidade dos presentes (que ainda eram bastantes) percebia-se um significativo mar de cabeleiras brancas, o que deixa perceber a faixa etária que ainda se desloca para estes concertos. E muita gente apoiada em bengalas, o que revela a paixão incontida de não perder um evento que, no seu âmbito, seria dos melhores que têm sido produzidos em Portugal.

Nada disto é de admirar. Sabe-se que as novas gerações não têm tido uma aproximação dedicada a este tipo de expressão musical. As centenas de concertos que se realizam por todo o país com grupos ou cantores de música moderna (grande parte deles estrangeiros) enchem pavilhões ou fazem sufocar milhares de pessoas em espaços abertos que gritam e esbracejam para acompanhar os seus ídolos. E não é por uma questão de preço, porque os bilhetes do S. Carlos foram bastante acessíveis, mais baratos mesmo do que muitos de que tenho ouvido falar para concertos rap, pop, “metal” e outros quejandos. Trata-se muito mais do gosto, da cultura, da proximidade da gente jovem com as novas disciplinas musicais. Também oiço algumas delas (em “mode” remoto, televisão) e devo dizer que tenho ouvido belas peças, belos conjuntos e belos cantores. Não se trata de excluir tipos de música, trata-se muito mais de não ter havido ainda o envolvimento e a força para que sejam apreciados e acompanhados todos os estilos, em especial o da música clássica. Quem tem familiares (pais ou avós) já ligados a este tipo de música poderá vir a ligar-se a ela, a aprendê-la, a conhecê-la. Eu disse “poderá”, porque esse fenómeno não funciona como regra. A tudo isso se sobrepõe a paixão, o encantamento de ter ouvido certos clássicos ou os seus intérpretes e interessarem-se por uma aproximação. Na sala do S. Carlos havia muita gente nova o que não vem negar o que tenho vindo a exprimir.

Voltamos sempre ao tema das Artes entre nós e, neste caso especial, da música. As escolas de música existentes, públicas ou privadas, estão normalmente cheias de jovens a aprender o piano, o violino, o saxofone, o viloncelo e muitos outros instrumentos. O que acontece é que, pela pressão do sistema de ensino, essas aprendizagens são abandonadas em favor das matemáticas, das físicas, das ciências e tudo aquilo que verdadeiramente conta para o seu acesso curricular. Tocar bem violino não lhes garante um bom e tranquilo acesso à vida. Por isso desistem e escolhem o que “tem que ser”. Mas não devia ser assim, deviam também poder conciliar com aquilo que “poderia ser” e que lhes dá prazer e felicidade na vida. É como no Desporto de Alta Competição: são raros os casos de conciliação das atividades ditas de extracurriculares com as curriculares. Como na Música, as felicidades das vidas são levianamente interrompidas. Há muito que se fala, todos os dias se fala, nas necessidades de adaptação do sistema educativo a toda esta galáxia de atividades. Mas as coisas são lentas. E por isso a sala do S. Carlos estava cheia dos cabelos brancos que esperam, ou até estimulem, o aparecimento de muitos jovens que enchem a sala e saiam felizes pelo que ouviram. E, sobretudo, que saibam dar o justo valor aos que, em palco, os terão encantado.

Mas voltemos ao início do tema. No espetáculo de ontem foram tocadas e/ou cantadas peças de Mozart, Donizetti, Massenet, Mascagni e Alfredo Keil. Peças cantadas pelas sopranos Susana Gaspar, Carla Caramujo, pela meio-soprano Cátia Moreso, pelo tenor Luís Gomes, pelo barítono Luís Rodrigues e pelo baixo João Oliveira. E, claro, pelo Coro do Teatro Nacional. Como se vê, todos artistas portugueses, de grande qualidade, com excelente formação e com muita divulgação em todo o mundo. É saboroso e compensador confirmar que o nosso meio musical, chamado de clássico, incorpora profissionais com a estatura e projeção que em toda a parte se lhes reconhece. Todas as interpretações foram de grande qualidade e mereceram os aplausos e elogios do público presente.

No fim do estáculo foi, então, prestada a homenagem prevista aos cantores portugueses que pisaram o palco do S. Carlos no último século. Nem todos estão vivos mas os ausentes foram representados por familiares. Os homenageados foram: Lia Altavilla, Palmira Troufa, Carlos Guilherme, José Manuel Araújo, Jorge Vaz de Carvalho, José Fardilha, Carlos Fonseca, Cristina de Castro, Zuleica Saque, Elsa Saque, Álvaro Malta, Elvira Ferreira e Elisette Bayan. Para quem não os conheça (eu alguns nunca os tinha visto) será uma bom altura para se consultar o Google e ver o que por lá se diz dessa gente. Parabéns aos homenageados.

Os poucos discursos finais foram encerrados com algumas palavras de uma representante da Secretaria de Estado da Cultura. Falou bem e acertado. Falta só saber se, como em tantas outras ocasiões, não serão só bonitas palavras.

Parabéns à Elisabete Matos por esta notável iniciativa. E, já agora, oiçam árias de ópera. A maior parte delas são lindas e conhecidas. Há muitos anos vendia-se um disco, ainda em vinil, de 33 rotações, que se chamava “Música Clássica para quem não sabe nada de Música Clássica”. Ainda tenho esse disco. Foi por aí que comecei… Mas agora há milhões de modernos e fantásticos meios que nos facultam tudo isto de que vos acabo de falar. Interessem-se e leiam coisas sobre ópera. Temas e libretos hoje quase improváveis, mas com músicas lindíssimas.

Um pensamento sobre “CONCERTO CORAL-SINFÓNICO

  1. Muito oportuno, este texto, onde se menciona a distorção da cultura musical. Infelizmente, este tipo de cultura é normalmente adquirido em casa, ou em meios aleatoriamente aderentes onde se discute a beleza da música chamada séria, formalizando elites, tantas vezes injustas em relação a outros belíssimos acordes de música romântico-moderna, como muito de bom tem aparecido no musicall mundial. Também, as sociedades onde a cultura foi ou continua a ser selectiva, é parte culpada da redução de aderência pelas camadas mais jovens, sempre bombardeados por uma modernidade de atractivos musicais, a maioria de um mau gosto tremendo, sentindo nela um forte aliado na sua luta de independência juvenil.
    Todos nós somos testemunhos desse fenómeno,e mesmo aderido a outros gostos, mesmo que em nossas casas, nos tivéssemos habituados a ouvir música clássica, como no meu caso, reforçado pelo som de piano lá de casa, onde a minha irmã aprendia, existindo apenas para Beetoven, Chopin, Schubert, Liszt e Gounod “, sob a tutela de uma professora do Conservatório de Lisboa. O resultado foi péssimo, numa época em que os endiabrados Swings e os Boogie-Woogies do final da guerra, nos inundavam com outros costumes.
    Mas não sendo tudo isto, a regra, muito de bom tem aparecido, podendo comparar os tempos dos grandes compositores, onde a melodia se fazia apenas com instrumentos tradicionais e em compassos diferentes, alguns ainda hoje modernistas (para a época em que viveram) como Mozart, ou ainda bem mais recente, o colossal mestre de todos os sons, da Cavalgada das Valquírias , Richard Wagner… !
    Ainda ontem, estive a ver uma gravação de um espectáculo em Maastricht, executada pela grande orquestra de André Rieu, em pleno espaço aberto, Como me satisfez, a forma como todo o povo com mais ou menos cultura, aderia aos movimentos diversos de música clássica, à mistura com valsas de Strauss e algumas piadas para recriar ambientes propícios ao entendimento de públicos menos conhecedores, ainda que sem as formalidades de uma ética tão do gosto do nosso S. Carlos, mesmo que em espaços abertos do seu largo fronteiro…!.

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