Cuidado com os tachos!

Recentemente em França, antes de Emmanuel Macron iniciar um discurso sobre o seu plano de aumentar a idade da reforma de 62 para 64 anos, a população resolveu, pelo seu lado, iniciar um “concerto” de tachos e frigideiras, fortemente batidas por colheres de pau. Nada que não conheçamos mas que talvez seja bom prevenir, levando em conta os muitos antecedentes que a memória nos relata. Nessa altura Macron disse ao microfone que, na terra dele, os tachos e as panelas eram para cozinhar ou fazer ovos mexidos. De nada lhe valeu. O estrépito foi ainda maior e o barulho impediu-o de falar em segurança. E, a partir dessa altura, os concertos das frigideiras nunca mais pararam, trazendo-nos à memória as manifestações de tachos na Argentina, Argélia e Líbano.

Esta prática não é nova. Já em França, em 1830, quando os republicanos se manifestaram contra o Rei Luís Filipe, foi utilizado o mesmo processo. O som do bater de panelas juntando-se à gritaria dos manifestantes ganhou, aliás, o nome de “charivari” que os nossos hábitos linguísticos também adotaram.

As décadas de 1950 e 60 foram férteis nestas manifestações. Na Argélia, durante as guerras da independência, a OAS encheu o país com terremotos de tachos e panelas por todos os lados. A seguir, já em 1971, a “guerra” das caçarolas opôs-se ao regime de Salvador Allende. 40 anos depois as ruas de Buenos Aires ficaram pejadas dos mesmos instrumentos em resposta à terrível crise económica por que passaram. Mais recentemente os tachos apareceram em Myanmar e no Canadá. Em outubro de 2019 foi no Líbano, acompanhados por protestos das janelas. No Kenia aconteceu o mesmo já este ano.

A França, como sempre e como dizia o seu antigo presidente George Pompidou, tem o povo mais difícil de governar. E nos tempos mais recentes não perdeu esse interessante hábito. Em 2017, durante a campanha eleitoral do seu candidato François Fillon, também apareceram as inevitáveis caçarolas acompanhadas da expressão “trainer des casseroles “ que, traduzido à risca significa “esqueletos no armário “ . O “esqueleto “ do Fillon foi ter arranjado um falso lugar para a mulher como “assistente parlamentar “, razão pela qual foi preso.

Isto, portanto, dos tachos e das panelas não é tão inocente como possa parecer. Nos tempos que correm e com os milhares de iniciativas que os conselheiros políticos mais ligados a coisas de populismo andam sempre a imaginar, não nos surpreenderia muito que aparecessem algures por aí umas colheres de pau a baterem em tachos e frigideiras gritando por melhores condições de vida para todos os que trabalham e para os que não trabalham. Com exceção dos jogadores de futebol que esses já têm tachos que cheguem. Os que arranjam clube, claro.

Em

Um pensamento sobre “Cuidado com os tachos!

  1. Um assunto que começa a criar um novo apetite para a contestação. Como será o ritmo, talvez não o saiba responder. Talvez um batuque ritmado, saído da 5ª Sinfonia de Beethoven, ou os estrondosos sons de Wagner, poderão também criar uma certo ambiente melodramático na velha guarda sempre comedida, nomeadamente, dos tachados pelas Finanças, intitulada de classe média. Mais acomodados e por vezes mais incomodados, poderei imaginar, se em vez dos conhecidos tachos, vierem a ser utilizadas as panelas de pressão …! Então, os perigos de explosão serão bem mais audíveis para os lados de S.Bento…!

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