MITOLOGIA

Sob a orientação e coordenação da romancista e filósofa francesa Catherine Clément, o jornal Le Monde está a publicar uma interessante série de figuras mitológicas importantes e, principalmente, as suas relações e influências nos séculos mais recentes.
A introdução à obra, escrita por Christophe Averty, resume muito bem os temas e as implicações deste mundo tão vasto dos mitos e da mitologia. Escreve ele:

Por vezes a verdade histórica importa pouco. A Guerra de Troia pode ter tido lugar, algures não se sabe bem onde. Os seus heróis e o seu monumental cavalo de madeira entraram no panteão das lendas. Através das brumas da memória humana, Helena, Paris, Heitor, Afrodite, Ulisses e tantos outros atravessaram os séculos.
Tal é a força do Mito, passado de forma oral ou escrita, para depois chegar à escrita,à pintura, à música, ao cinema. Pela poesia de Ovídio ou a verve de Homero, os toques mágicos de Greco ou de Goya, pelo humor de Offenbach, a prosa de Giraudoux ou ainda os efeitos especiais de Hollywood, o imenso cortejo dos mitos greco-latinos nunca cessou os seus encantamentos.
No trabalho coordenado por Catherine Clément, por ordem de entrada em cena, aparece Zeus, mestre dos relâmpagos e vencedor do mundo subterrâneo, considerado o deus dos deuses. Sedutor, vingador e sanguinário ele será o dominador de um mundo onde o real e o imaginário se conjugam. Porque no Olimpo tudo é possível. Quando se desce à Terra os destinos dos deuses são mais caprichosos.
Ulisses vence terras e mares, envolve-se com monstros e belezas surreais. O semi-deus Hércules cumpre os seus doze trabalhos para garantir o seu destino.
A mágica Medeia derrama o sangue do seu irmão por amor enquanto que o rebelde Orfeu perde a sua bem-amada e lança-a nos infernos.
Os mitos abrem a nossa imaginação. Identificando-se como eles, deuses e mortais mostram-se tal como são: humanos. No fundo, por Zeus, isto faz parte da nossa história!

Já segundo a descrição de Catherine Clément os deuses greco-romanos nunca estão sós nem nunca são livres. Os que forem libertários ou libertinos podem ser punidos e perderem, por algum tempo, os seus poderes. Quanto aos seus valores religiosos, a distância que nos separa dos tempos antigos faz-nos esquecer o essencial: os deuses foram objeto de cultos fervorosos e inspiravam terror.
Na Índia ainda se pode avaliar a omnipresença e a proximidade de inúmeras divindades.
É no domínio musical que a evocação desses deuses é mais frequente. Desde o século XVII que as óperas de Monteverdi e Gluck fazem descer Orfeu aos infernos.
O rei Luis XIV, que se identificava com Apolo, deus do sol, encomendou músicas e ballet barrocos com a participação da maior parte dos deuses e heróis.
No século XIX, se Wagner utiliza a mitologia nórdica, Offenbach, principalmente na Bela Helena, populariza o Olimpo com uma ópera-bufa.
A mitologia inscreve-se na pintura histórica e religiosa, permitindo muitas vezes aos artistas contornarem as censuras da igreja e do poder. Assim, Goya, Botticelli transmitiram essas mensagens antigas.
O cinema e as séries televisivas apropriaram-se também de muitos daqueles heróis. Cristophe Honoré adaptou ao cinema o poema épico de Ovídio, “Metamorfoses” e lá aparecia a personagem de Zeus a conduzir um camião vermelho e ameaçador.

Este trabalho apresentado pelo Le Monde ou já é conhecido de muitos dos meus seguidores ou chegará, em breve, até nós. Não deixa, no entanto, de ser um aspeto cultural pelo qual alguns de nós passaram de relance quando fizemos os nossos estudos. Alguns não voltaram ao assunto, outros dedicaram os seus tempos a apreciar esse mundo extraordinário. A literatura, a pintura, a música obrigam-nos a regressar a esse passado deslumbrante.
O texto de hoje talvez não sirva para nada mas talvez desperte a curiosidade de muitos. De qualquer maneira recomendo.

Um pensamento sobre “MITOLOGIA

  1. Um belíssimo texto, que ultrapassa os meus fracos conhecimentos obtidos da História Universal, mais propriamente do velho quinto ano do Liceu. Foi uma parte da História, que ficou resumida aos feitos de Ulisses, de Troia, da sua ilha de ítaca e dos mitológicos Deuses do Olympo. A Odisseia e a Ilíada, que manifestamente tenha influenciado Camões nos seus contos épicos, que nos ia enchendo de orgulho, em cada Canto que líamos, dos Lusíadas. Somos assim, pela curiosidade do saber, como se pensava dantes, dos medos e dos heroísmos que tanto ainda nos atraem. Pelas artes e pela música. Pela forma bem descrita, fiquei curioso, e vou procurar o Le Monde…!

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